OPPENHEIMER TRAZ REFLEXÃO SOBRE O MAIOR PROBLEMA HUMANO (2023, de Christopher Nolan)

UMA EXPLOSÃO NA MENTE DO PROTAGONISTA E DO PÚBLICO

O novo longa-metragem de Christopher Nolan, Oppenheimer estreia nos cinemas dia 20 de julho. Baseado no livro merecidamente vencedor do prêmio Pulitzer, Oppenheimer, o triunfo e a tragédia do Prometeu americano, de Kai Bird e Martin J. Sherwin, a adaptação engenhosa conta parte da história de Robert Oppenheimer, interpretado por Cillian Murphy, mundialmente reconhecido pela série Peaky Blinders, (da BBC, disponível na Netflix) retratando através de estrutura não linear os períodos antecedentes à criação da bomba atômica e suas consequências na vida do homem que ficou conhecido como “o pai” da mesma.

Não é um filme fácil de assistir, com muitos diálogos contendo termos científicos, o roteiro foi construído de forma não-linear, e exige olhos apurados para sua compreensão. O próprio diretor, que também escreveu o roteiro, deixou claro em entrevistas que optou por filmar cenas objetivas no preto e branco, e subjetivas com cores.

Simplificando, a maioria das cenas em preto e branco são das investigações em cima das acusações de ligação com o comunismo, arquitetado por Lewis Strauss, interpretado por Robert Downey Jr (Vingadores: Ultimato). As cores, contam a história da maneira que um físico gênio enxerga seu propósito, vendo além dos números e cálculos o poder sobre a vida, o ato criacional em cima de uma transformação do elemento básico do universo: átomos.

A grande busca de Robert Oppenheimer, judeu, é a construção da bomba motivado por desejos pessoais que incluem deter o conhecimento da execução da bomba antes da Alemanha de Hitler na segunda guerra; nisso, ele sai da teoria e explora a prática junto a excepcionais cientistas, monta uma espécie de bairro no meio do nada para a execução do projeto Trinity.

Paralelo à isso vemos Robert Downey Jr arquitetando a derrocada do físico, num tempo posterior aos resultados da bomba atômica, revelando numa bombástica interpretação dele não vista há muito tempo, e conforme lembra Nolan: desde o filme de Chaplin – que ironicamente ele interpreta a vítima injustiçada por um Estados Unidos da América que se mune contra o suposto comunismo do artista, junto às investigações de J. Edgar Roover do FBI. Já neste filme o contrário, sendo ele o antagonista visando prejudicar alguém injustamente, de maneira suja como pode ser visto, por pura inveja ao mérito de algo que Oppenheimer sequer se orgulha verdadeiramente. É um Robert Downey Jr. que essa nova geração ainda não conheceu, e que infelizmente talvez nem deem o devido valor tal qual a potencial dificuldade do filme em dialogar com públicos acostumados a assisti-lo em filmes que exigem menos olhar cinematográfico da coisa.

Destaque também às atuações de Emily Blunt (Jungle Cruise, O Diabo Veste Prada), como esposa de Robert Oppenheimer, cativante e poderosa, digna de prêmio. Matt Damon (Perdido em Marte) com um senso de humor muito singelo, sabendo trabalhar bem com as falas do roteiro.

Rami Malek parece um figurante durante grande parte do filme. O vencedor do Oscar então se torna peça chave na grande virada da trama, simplesmente abrindo a boca e falando a maior quebra de expectativas de todas.

Ao término do teste com a bomba, Oppenheimer é deixado para escanteio pelos Estados Unidos, Hiroshima e Nagasaki explodem, e cai sua ficha, internamente, sobre ter se dedicado a cálculos com base em coisas do universo, e recriado de certa forma o momento da criação de tudo, dos átomos à vida; no entanto, transformada em artefato para a morte.

O cartaz do filme exibe a bomba atômica e seu criador, diante do voluptuoso fogo de uma explosão e diversas fagulhas espalhadas a frente de Oppenheimer, nos remetendo às galáxias naquelas fotos tiradas por mega telescópios; Cillian Murphy carrega culpa no olhar. Um dos melhores atores que existem se analisarmos a natureza do olhar capaz de dizer tudo sem precisar das palavras.

A culpa da personagem cresce, e como disse ele quando vivo “eu me tornei a morte, a destruidora de mundos”, em referência a um texto sagrado hindu Bhagavd-Gita. O próprio filme antes de começar traz essa alusão ao mito de Prometeu, numa frase sobre ele “ter trazido o fogo para a humanidade e ter sido punido.”

Sim, é possível enxergar pelo ponto de vista de Robert Oppenheimer. A fotografia e o design de som primoroso consegue trazer ao produto a sensação de sufocamento. Ele vai explodir a qualquer momento, pois, do seu esforço veio o poder de se igualar ao divino. O poder do caos então, o assusta.

UMA TENTATIVA DE RETRATAÇÃO HISTÓRICA

Robert Oppenheimer sabia a todo momento o que estava fazendo, e mesmo assim continuou, mas foi usado para interesses maiores, numa nação onde o patriotismo beira a idiotice. Dizem por aí ser difícil criar empatia com o homem que criou a bomba atômica, mas digamos, o ser humano consegue se autodestruir, então isso seria culpa do conhecimento? Dos avanços tecnológicos baseados no esforço de quem estuda, ou o sujeito que aperta o botão leva o mérito mundano de rei do caos?

Destaca-se no filme a expectativa criada por Nolan no entorno da explosão principal. A contagem regressiva começa, os cientistas se acomodam para assistir, são espectadores como nós. É uma imersão. De fato, podemos crer estarmos presentes, sem nenhuma outra hipótese. A chance do mundo acabar com aquilo é quase zero. Quase. A trilha sonora de Ludwing Görasson é um nirvana, e então…

O coração acelera, inevitável. O filme inteiro antes disso trata o som explosivo sem pudor algum, então o que se espera é o ápice. Nolan nos entrega surpreendentemente uma obra de arte, uma pintura, o momento da criação, fascinante, sufocante, hipnótico. E por fim, um segredo que a presente crítica se resguardará.

QUEM SOMOS NÓS EM OPPENHEIMER?

Na era da ameaça das Inteligências Artificiais, quando humanos alimentam em tom de brincadeira e curiosidade o artificial sem dar a devida seriedade ao longo prazo, ironicamente Oppenheimer é lançado em meio à uma greve que ocupa Hollywood; os roteiristas e atores lutam não só por salários melhores mas também pela vitória nessa guerra contra a utilização das IA’s em produções cinematográficas.

O que isso tem a ver? Pois bem, assim como os entusiastas alimentadores dessa tecnologia nova, Oppenheimer também sabia o que estava fazendo, não existe inocência. É evidente um cíclico impasse sendo exposto entre a raça humana, onde a capacidade de evoluir tecnologicamente induz por escolha a possibilidade de banalização e automação do trabalho humano, consequentemente a autodestruição. Qual seria então a relevância de Oppenheimer, o novo filme de Christopher Nolan em pleno 2023?

Muitas perguntas, sendo esta última retórica, pois, ao longo da história, a raça humana parece se empolgar muito mais pela conquista que no aprendizado de si mesma.

A sociedade, apertará o botão para abortar a missão, evocará os estudos como fonte de praticidade e melhoria de vida? Talvez seja tarde demais, a guerra é o fardo dos animais, que dirá os racionais, responsáveis por usar tudo e todos quando precisam e descartar, pela ganância, inveja. Pelo simples ato de pensar que se armando, estará em defesa. E de fato, como voltar atrás do caos?

Oppenheimer é para poucos, mas feito para todos. Assim como encarar os fatos: responsabilidade científica, sobretudo humana.

Título Original: Oppenheimer

Direção: Christopher Nolan

Duração: 180 minutos

Elenco: Cillian Murphy, Emily Blunt, Matt Damon, Robert Downey Jr., Florence Pugh, Gary Oldman, Jack Quaid, Gustaf Skarsgård, Rami Malek e Kenneth Branagh

Sinopse: O físico J. Robert Oppenheimer trabalha com uma equipe de cientistas durante o Projeto Manhattan, levando ao desenvolvimento da bomba atômica.

TRAILER:

Afim de explodir a mente? Vai conferir Oppenheimer, exclusivamente nos cinemas!

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