Crítica: Thelma e Louise (1991, de Ridley Scott)

Um filme que combina a atmosfera de um faroeste com a adrenalina de um filme policial e a suavidade de um drama forte e humanizado, com protagonistas fortes e envolventes, e um roteiro com diálogos cirúrgicos e propositalmente oscilantes para combinar com as nuances e camadas que vão sendo desnudadas aos longo da trama.

A direção é muito competente em capturar tanto os ambientes quanto as expressões verbais e faciais dos atores de forma harmônica, e por se tratar de um road trip movie, ou seja, filme “pé na estrada”, fluidez frenética e convergente com que os acontecimentos vão se sobrepondo e até mesmo, se desencadeando entre si como uma espécie de reação em cadeia com efeito dominó que exibem uma competência técnica dentro de sua simplicidade. A fotografia e ambientação se unem à direção e trilha sonora, junto com os figurinos; e esses elementos criam a caracterização das pessoas, lugares e regiões pelas quais vamos passando junto com as protagonistas em sua viagem literal e psicológica.

No que diz respeito a direção, Ridley Scott é muito competente em tudo o que faz, tendo uma filmografia diversa e de qualidade. É quase palpável o cuidado do diretor em construir cenas simples, nítidas e que se complementam com os diálogos e expressões dos atores, assim conseguimos sentir pelas personagens e a história nos toca como se tivéssemos algum vínculo com elas. Scott consegue extrair o melhor resultado sem exageros, sem inserções cíclicas e sem recorrer a recursos que possam romper com o clima composto pela obra. Percebemos que Ridley não abre mão de recursos tecnológicos e modernos para a época de seu filme, mas os recursos práticos ou combinações prático/tecnológicos tornam suas composições únicas e adaptadas ao gênero e ao tipo de escrita e fio condutor que a história em questão possui. Em suma, cada filme dele é uma experiência sensorial e emocional pensada e executada para ser única, com classe e expansão conceitual, cuja assinatura do diretor é o capricho total com tudo envolvendo suas películas.

Quanto às atuações, todas são bem executadas, até mesmo pelos coadjuvantes e pequenas participações. Os destaques vão para as duas protagonistas Thelma (Geena Davis) e Louise (Susan Sarandon), que nos convencem de uma amizade sólida e compreensiva, em que os opostos e ponto comuns que possuem nos fazem inclusive pensar sobre como a amizade nos liga à pessoas tão diferentes de nós, mas com quem compartilhamos tanto. Vale menção a aparição breve porém icônica de Brad Pitt ainda jovem, exibindo todo seu carisma e charme nos seus tempos áureos de galã.

Todos os atores estão bem em seus papéis, ainda que a relevância dos personagens, o tempo de tela, o desenvolvimentos de suas personalidades e subtramas, a relação entre eles e o brilhantismo de cada performance seja relativa ao efeito de cada um desses aspectos sobre a trama principal, e também a percepção do público que é individual para cada um que assiste o filme; mas não existe nenhuma atuação que não tenha ao menos o comprometimento dos envolvidos em representar personalidades críveis que se assemelham aos arquétipos da vida real. Os atores inclusive saem do lugar comum que involuntariamente podem ser colocados por representarem personagens dentro dos mesmo espectro, e entregam camadas e mais camadas de humanidade e fervor, de maneira que em certo ponto passamos a ter a sensação de que essas pessoas existem, aquelas sobreposições rocambolescas de acasos estão acontecendo e que a vida dessas pessoas esta prestes a ser mudada. É incrível como sabemos se tratar de um filme por causa dos rostos famosos que vemos na tela, mas sentimos e absorvemos como se fosse uma cobertura jornalística ou documentário, algum tipo de transmissão ao vivo por causa de verossimilhança das atuações.

Sobre a trama, também simples, fluída e bem ajustada, somos convidados a passar um fim de semana com as amigas, e vamos entrando junto com elas num espiral de eventos e numa montanha-russa de emoções e verborragia, sempre plausíveis, acertados ao tom do momento do filme e costurados à toda narrativa desenhada pela trama. Testemunhamos amizade feminina, improvisos e expressões cômicas que fazem a obra continuar com a gente por longos instantes depois de seu fim. Um destaque para as alegorias e para o uso do espaço natural feito pela direção na segunda metade da película, que é de um brilhantismo comedido e sofisticado, acompanhando também as alterações estilísticas e composições visuais das intérpretes.

O roteiro da então iniciante Callie Khouri ganhou o Oscar de Melhor Roteiro Original por essa pérola, que além de reluzente, em nada envelhecido, valorizado e fruto de algo interior muito puro e natural. A forma como foi escrito e amadurecido cimenta a qualidade dos demais aspectos do filme; principalmente porque a competência da direção, elenco e produção não seria capaz de dar substância a um roteiro inferior, e no trabalho em questão, vemos a mão de um diretor absorto em tudo o que faz dar forma e volume a uma escrita formidável e perspicaz.

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No mais, é um filme rico e enxuto, que em suma nos leva para um passeio de carro que transforma nossa perspectiva. Um clássico que enaltece a mais pura e furiosa força feminina e a do vínculo entre mulheres.

Titulo Original: Thelma & Louise

Direção: Ridley Scott

Duração: 130 minutos

Elenco: Geena Davis, Susan Sarandon, Brad Pitt, Michael Madsen, Christopher McDonald, Harvey Keitel, Stephen Tobolowsky

Sinopse: Cansadas da vida monótona que levam, duas amigas, uma garçonete quarentona e uma jovem dona-de-casa resolvem deixar tudo para trás num fim de semana.

Trailer:

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