Crítica: A Crônica Francesa (2021, de Wes Anderson)

Analisando em retrospectiva a carreira de grandes diretores do cinema americano, é muito comum encontrar um ponto específico no qual o cineasta ganhou o respaldo dos executivos para fazer o filme que bem entender – normalmente levados por um sucesso recente do diretor.

Após o premiadíssimo Noivo Neurótico, Noiva Nervosa, Woody Allen se arriscou no drama Interiores, filme muito influenciado pelo cinema de Ingmar Bergman que se distanciava radicalmente de seus trabalhos anteriores. Já Martin Scorsese foi pelo caminho oposto; após uma sequência de três sucessos composta por Os Bons Companheiros, Cabo do Medo e A Época da Inocência, o diretor fez Cassino, seu filme mais “scorseseano” até então.

Após o sucesso de O Fantástico Senhor Raposo e Moonrise Kingdom, esse ponto parecia ter chegado para Wes Anderson com o lançamento de O Grande Hotel Budapeste. O filme que mais encapsulava todos os elementos da filmografia de Anderson acabou se tornando seu maior sucesso de público e crítica, além de ter rendido ao cineasta sua primeira indicação ao Oscar de Melhor Direção.

Em A Crônica Francesa – seu primeiro filme live-action desde O Grande Hotel Budapeste – o diretor dobrou a aposta. Desde o primeiro enquadramento, é impossível não reparar na utilização de absolutamente todas as marcas visuais do cineasta: os travellings verticais, a simetria nos quadros, as mudanças no formato da tela, o esquema característico de cores vibrantes, entre outros.

Nesse ponto, é difícil reclamar do filme. Apesar de não ter o visual mais inspirado na filmografia do diretor, seus fãs certamente sairão satisfeitos com a fotografia, pois ela entrega tudo que pode se esperar de um filme do cineasta. O problema é que, no que parece uma tentativa deliberada de ser ainda mais Wes Anderson do que foi em O Grande Hotel Budapeste, o diretor entra em uma viagem de autoindulgência que torna A Crônica Francesa um de seus piores filmes – se não o pior.

O filme começa com o anúncio da morte de Arthur Howizter Jr. – Bill Murray, sempre ótimo – dono de uma revista que deixou em seu testamento o desejo de que ela seja encerrada após sua morte. Após isso, vemos, por meio de flashbacks, como era sua relação com os repórteres, e a encenação de algumas histórias publicadas ao longo dos anos em que a revista esteve em circulação.

Numa tentativa de simular a estrutura de uma revista, Anderson divide o filme em três reportagens: a primeira entraria no caderno de cultura, a segunda no de política e a terceira no de culinária.

A primeira história é estrelada por Benício Del Toro, Lea Seydoux e Adrien Brody e conta a história do surgimento de um museu e, apesar de já contar com alguns dos problemas que viriam a se agravar nas seguintes, é a melhor de todas. Nela, o diretor vai direto ao ponto, conta uma história redonda, interessante, e consegue deixar o público curioso para o que viria a seguir.

Na segunda, vemos a história de um jovem que se torna símbolo de um movimento estudantil. A narrativa é cheia de clichês e, apesar da sempre competente Frances McDormand, não é engajante em momento algum – o que, sim, pode ser colocado na conta da falta de carisma de Timothée Chalamet e seu bigode, mas também demonstra que o diretor parece estar mais interessado em ostentar seu talento visual e homenagear a estética do cinema francês do que em contar uma história interessante.

A terceira história consegue ser ainda pior, e demonstra uma falta de foco tão absurda que é difícil descrever sobre o que ela trata, mas é um artigo sobre culinária que acaba se tornando a história de um sequestro – o que, mais uma vez, comprova que os únicos interesses do diretor eram criar situações em que sua habilidade com a câmera seria notável e inserir na trama personagens que chamariam a atenção pelo quão “Wes Anderson” eles são.

Com um elenco estrelado e cheio de colaboradores frequentes do cineasta, os personagens estão mais cartunescos do que nunca, e, dessa vez, sem criar o menor tipo de engajamento no público. Até momentos que se tornam bons após o término do filme são desagradáveis durante a projeção, muito por causa da mão excessivamente pesada do diretor, que faz tudo soar altamente artificial.

Muito disso se deve à falta de harmonia entre a forma e o conteúdo, que funcionou tão bem em seus melhores filmes, nos quais a maneira de filmar acrescentava à história que ele estava contando. Aqui, seus planos, por mais bonitos que sejam, são vazios, não dizem nada.

Em vários momentos, o editor interpretado por Bill Murray faz concessões em relação ao tamanho das matérias e deixa passar a falta de foco e os excessos cometidos pelos repórteres. O que parece ser um comentário de Wes Anderson reconhecendo as falhas de seu filme perante ao público acaba por se tornar apenas mais um elemento de autoindulgência do diretor, que, mesmo reconhecendo os excessos em seu filme, decidiu mantê-los, o que culminou na pior experiência proporcionada por Wes Anderson desde o início de sua boa, mas irregular carreira.

Título Original: The French Dispatch

Duração: 1h48

Direção: Wes Anderson

Elenco: Bill Murray, Lea Seydoux, Timothée Chalamet, Benício Del Toro, Jeffrey Wright, Frances McDormand, Tilda Swinton, Owen Wilson, Adrien Brody, Saoirse Ronan, Elisabeth Moss, Willem Dafoe, Edward Norton, Christoph Waltz, Liev Schreiber

Sinopse: A equipe de uma revista francesa decide publicar uma edição destacando três das melhores histórias da última década: um artista condenado à prisão perpétua, revolta estudantil e um sequestro resolvido por um chefe de cozinha.

Trailer:

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