Larry David: A Mente Brilhante Por Trás de Seinfeld e Curb Your Enthusiasm

Em 1989, Larry David se juntou ao comediante Jerry Seinfeld para criar um sitcom para o canal NBC. David queria produzir algo diferente do que outras comédias já faziam na televisão americana. Uma série de comédia que fugisse dos moldes estabelecidos até então. O lema de David no set da série era “sem abraços, sem aprendizado”, ou seja, o roteirista queria escrever uma comédia que em nenhum momento apelasse para o lado emocional do público e onde os personagens fossem pessoas egoístas e egocêntricas, sem nenhuma intenção de melhorar. Assim surgiu Seinfeld: uma das melhores produções cômicas já feitas até hoje.

Até então, a maioria das séries de comédia tinham convenções bem comuns e recorrentes: os protagonistas representavam uma noção de moralidade, os conflitos eram sempre resolvidos ao fim dos episódios e os personagens sempre estavam dispostos a melhorar. Séries populares nos EUA como I Love Lucy, The Mary Tyler Moore Show e Cheers seguiam essa premissa básica. Mesmo quando os personagens tinham personalidades fortes e faziam comentários ácidos uns sobre os outros, no fim do dia existia um laço afetivo forte entre eles, e eles eram representados como agradáveis e simpáticos. Mas Seinfeld chegou para quebrar com tudo isso.

Logo na primeira temporada, já fica estabelecido que os protagonistas da série, em especial George Costanza (Jason Alexander), seriam o oposto de qualquer senso comum sobre ética e moral. Os personagens eram completamente interesseiros, sempre pensando em si mesmos e sem nenhuma empatia por outros indivíduos (a menos que houvesse algum benefício próprio). Ao decorrer das nove temporadas, o público viu esses personagens mentirem, traírem, roubarem e até indiretamente matarem, e mesmo assim continuavam confortavelmente esperando o próximo episódio. O crédito da popularização do anti-herói geralmente vai para The Sopranos, mas Seinfeld já estava entregando protagonistas desprezíveis desde o início dos anos 1990.

O lema “sem abraços, sem aprendizado” de Larry David foi levado a sério até o final da produção em 1998. O series finale de Seinfeld foi um dos mais revolucionários para um sitcom e divide opiniões até hoje. A decisão de encerrar a série sem um final feliz, com um tom extremamente cético e niilista, foi a cereja no topo de uma das maiores obras cômicas da TV americana, provando que ainda havia muito espaço para ideias novas. Seinfeld abriu um novo caminho para todas as séries de comédia que vieram depois (desde Two and a Half Men até The Good Place) e provou que uma comédia não precisa seguir regras para ser boa. Muito pelo contrário, quebrá-las é sempre muito melhor.

Com Curb Your Enthusiasm, Larry David encontrou na HBO um veículo ainda melhor para expandir seu senso de humor depreciativo e problemático. E escreveu um personagem ainda mais insuportável e egoísta que George Costanza: ele mesmo. Na série, David interpreta uma versão exagerada e satirizada de si mesmo vivendo todo tipo de situação desconfortável e vergonhosa, na maioria das vezes causada por ele mesmo.

A série explora as convenções de situações cotidianas como um jantar entre amigos ou um batizado. Em todos esses contextos, Larry sempre é a pessoa inconveniente que quebra todas as regras sociais implícitas. Ou ele reclama da comida na cara do anfitrião da festa ou se recusa a tirar os sapatos quando entra na casa da pessoa, mas sempre encontra uma forma de ser grosseiro quase que ingenuamente. Larry ficou conhecido como um “assassino social” por desrespeitar toda e qualquer norma de convivência.

O que torna Curb Your Enthusiasm tão especial é o roteiro brilhante de David (sim, ele escreveu todos os episódios da série) que sempre aproveita ao máximo todos os elementos apresentados durante o episódio. O enredo da comédia sempre faz um círculo perfeito juntando todos os subplots no ato final, sem deixar nenhuma ponta solta. Nada é trivial em Curb Your Enthusiasm, tudo tem um propósito.

Larry David revolucionou a forma de fazer comédia na TV americana. Em Seinfeld, ele explorou ao máximo o formato tradicional de multi-câmera (aquelas comédias com a risadinha de fundo) e quebrou tudo que o público esperava desse tipo de sitcom. 

Tanto as temáticas exploradas, quanto a estrutura narrativa da série foram extremamente inovadoras para a época, envolvendo o público com histórias que não necessariamente seriam aprofundadas. Os personagens não crescem, não existem arcos narrativos longos, nem casais para o público torcer. São apenas pessoas desagradáveis vivendo a vida. Como diz Saul Austerlitz em seu texto How Seinfeld Revolutionized the Sitcom para o IndieWire: “Seinfeld é uma maestral investigação sobre as insignificâncias da vida”. Ou como os próprios criadores afirmam: “Uma série sobre nada”.

Com Curb Your Enthusiasm, Larry David levou essa investigação do cotidiano a outros níveis, explorando profundamente as menores trivialidades sociais. O roteirista foi perspicaz ao dar atenção em suas obras a temáticas que são tão corriqueiras que a maioria das pessoas ignora, mas todo mundo vive. Por isso, David é, sem dúvidas, um dos maiores escritores de comédia da sua geração.


Já assistiram as séries do Larry David? Se não, não perde tempo. Vai lá e aproveita!

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