Por entre críticas e polêmicas, o que sobra de The Last of Us Part II? (2020, de Naughty Dog)

Há quase dez anos, a Naughty Dog, mesma produtora de Uncharted, anunciava The Last of Us, seu mais novo projeto que, se tornou um dos lançamentos mais influentes da indústria nos últimos anos e superou o estigma de mais um típico jogo de zumbis. O game foi um verdadeiro fenômeno, aclamado por crítica e público, eleito jogo do ano, ganhando ainda vários outros prêmios, reverberou inclusive em diferentes títulos, como o também aclamado God of War (2018) e, já conta com uma série televisiva em desenvolvimento pela HBO, notícia que você pode conferir aqui: The Last of Us será nova série da HBO


” – Swear to me. Swear to me that everything that you said about the Fireflies is true.
– I swear.
– Okay. “


E como superar esse final do game de 2013? O grande divisor de águas para The Last of Us, é sua característica de priorizar a narrativa ao gameplay, por mais que isso não seja algo incomum, o que marcou a comunidade foram seus protagonistas, Ellie e Joel, nos apresentando uma jornada sensível e sutil sobre suas relações e sentimentos. Desde então os jogadores clamavam por uma continuação, mas agora que lançada, a recepção para a Part II foi completamente outra.



Muitas das polêmicas envolvendo a sequência partem da própria Naughty Dog, como os recentes escândalos de crunch (prática conhecida no mundo dos games, em que os desenvolvedores são obrigados a exercerem cargas horárias de trabalho excessivas, até durante meses); os consecutivos adiamentos que o jogo recebeu; além ainda de seu completo vazamento, quando sequer possuía uma data de lançamento, o que forçou a empresa a correr para lança-lo agora em Junho. Contudo, essas questões parecem apenas somar ao real motivo pelo qual o jogo vem sendo duramente atacado. 


Na verdade podemos dizer que as duras críticas que The Last of Us vem recebendo, são motivadas principalmente pelo seu maior mérito, sua coragem. A começar pelo gameplay, esse não tão diferente do anterior, ou seja, todas as mecânicas do primeiro, se encontram aqui também, sendo um jogo de ação e aventura, em primeira pessoa, singleplayer e tudo mais, mas a Part II não só as amplia, como traz bastante novidades. Novos tipos de inimigos, confrontos com chefes, IA melhores, cenários mais amplos e diversos, novos tipos de veículos, de customização de itens e por ai vai, trazendo um sistema bem completo que até possibilita tocar violão com Ellie. Essa é outra diferença aliás, Joel é deixado de lado para trazer Ellie como protagonista jogável, trazendo assim um novo estilo de jogo, já que controlar ambos os personagens é algo bem diferente, com Joel sendo mais lento e pesado; já Ellie, rápida e esguia. 


Por mais que tenhamos aqui um gameplay mais refinado e cadenciado, isso não torna o jogo necessariamente mais divertido, não me entenda mal, jogar a Part II é uma experiência muito prazerosa, mas é aqui que sua ousadia volta a aparecer. No enredo Ellie está buscando vingança e, temos a mesma sendo explorada de maneira tão cheia, mas tão cheia que o game fica extremamente carregado, toda a sua atmosfera é pesada e quanto mais progredimos “pior” vai ficando. Eu sinceramente nunca vi o tema ser explorado dessa maneira em nenhuma outra mídia, e as sensações que a história nos traz são realmente catárticas, ele cria momentos chocantes e surpreendentes, com imagens que ficam com você mesmo após os créditos finais. Intensidade é outra palavra capaz de definir o que é jogar essa aventura. 
Vale ressaltar no entanto, que o jogo, ao contrário do que muitos o acusaram antes dele lançar, não apela graficamente ao extremo, nem de forma gratuita, nós temos aqui alguns dos momentos mais belos da relação de Joel e Ellie, mas o propósito da existência da sequência é bem nítido, destruir toda a sutileza do primeiro e nos fazer repensar sobre o que é The Last of Us, e a redenção desses personagens. Aqui é onde mora o maior risco, pois o título toma decisões narrativas muito fortes, obrigando-nos a ir a fundo em certas psiques, em que se quebra o ritmo do gameplay para favorecer o enredo, e muitas dessas escolhas certamente não foram feitas para agradar à grande maioria dos jogadores, como o próprio Neil Druckman, diretor criativo dos 2 jogos, já vinha dizendo. Sem contar os já citados vazamentos, que fizeram com que as informações não chegassem ao público da maneira que deveria, mas mesmo se tivessem chegado, a Sony já devia estar ciente e esperar uma repercussão dividida para a história. 


No entanto, mesmo com uma trama sim controversa, não é só ela que tem gerado revolta na internet, na verdade o jogo está tendo um papel fundamental em mostrar como a comunidade gamer é bastante tóxica. Ao simplesmente trazer como foco personagens femininas extremamente bem trabalhadas, ao invés de um puro sexy simbol, para serem salvas pelo herói branco barbado; explorar personalidades e gêneros diversos, como a homossexualidade de Ellie, introduzida ainda em Left Behind, expansão do primeiro game, mas que aqui se torna parte importante de quem ela é e entre outros. A Part II vem sendo vítima de diversas tentativas de boicotes, como mutirões para abaixar sua nota em sites agregadores de críticas, petições para a “cancelarem” e, diversos vídeos demonstrando ódio pelo game, com “fãs” destruindo suas cópias do título.

Todo esse efeito lembra alguns casos vistos no cinema e na televisão recentemente, afinal, como esquecer de Os Últimos Jedi, que gerou tanta controversa por se propor a ressignificar elementos da saga ou, com Watchmen, que muitos “fãs” dos quadrinhos, atacaram a série da HBO, por esta tratar de questões raciais e políticas, como se isso fosse algum demérito da obra e fosse alheio ao material original. O velho discurso dito por nerds que parecem não entender o que consomem e alegam que estão enfiando lacração e questões ideológicas onde não deveria haver, mesmo em uma franquia que há 40 anos, trata de rebeldes liderados por uma princesa resistindo a um grupo imperial opressor.

É fácil associar também a Part II à outro fenômeno do mundo dos games, Metal Gear, de Hideo Kojima. Lógico que não estou comparando-os, mas Kojima sempre bebeu de fontes cinematográficas, algo parecido com que faz Druckman. Lembram quando disse que algumas imagens ficariam com você mesmo após o fim da história? Então, não é preciso nem ir muito longe nas referências, listarei o final de Se7en só como uma delas. Outro ponto é a troca de protagonista que faz Metal Gear Solid 2: Sons of Liberty, em que todo o material promocional vendeu que jogaríamos novamente com Snake, mas que no jogo logo é substituído por Raiden, algo que gerou bastante polêmica na época, sendo nítida a inspiração de The Last of Us, que vem sendo acusado de mentir nos trailers e coisa parecida. Lembro também dos últimos episódios de Mortal Kombat, que pasmem vem recebendo reclamações pela falta de hipersexualização em suas personagens, o que será que esses “fãs” estão achando de como as figuras femininas são trabalhadas aqui?


Até o momento, apesar de todas essas questões, o novo capítulo da saga de Joel e Ellie, recebe boa avaliação da crítica especializada e tem se mostrado um sucesso comercial. Mas o que fica da Part II? Se terá um caminho tão glorioso quanto o anterior, apenas o tempo dirá, mas ela já mostra impactar a indústria igual, se propondo a quebrar barreiras e estereótipos que ele mesmo ajudou a pavimentar. Não é inclusivo apenas em sua narrativa, oferece também novas opções de acessibilidade e constrói seu próprio legado, estabelecendo um novo parâmetro para o que vem a seguir. 


The Last of Us Part II é singular assim como seu antecessor, mas ousa muito mais que este e, oferece uma experiência completa e estonteante, com um nível técnico irretocável; tanto em seu visual de ponta, mostrando todo o poder do Playstation 4 e da atual geração de consoles, ou em sua história contemplativa e violenta sobre vingança, com suas magnificas interpretações. Independente de como cada um absorva a trama contada, é impossível dizer que não temos aqui um roteiro e intenção de se tirar o chapéu, sendo a única ressalva, que por mais que a jogabilidade seja sim excelente, não é necessariamente gostoso de se jogar, podendo ser maçante em determinadas situações, mas fora isso vale cada centavo e ser apreciado do começo ao fim por todos. Mesmo dias após termina-lo, não consigo parar de pensar sobre. Uma obra-máxima dos videogames. Como último adendo, um elogio à mais uma vez ótima dublagem brasileira aqui e, à trilha sonora, do vencedor do Óscar, Gustavo Santaolalla.

Título Original: The Last of Us Part II 

Diretores: Neil Druckman, Anthony Newman e Kurt Margenau 

Roteiristas: Neil Druckman e Halley Gross 

Desenvolvedor: Naughty Dog 

Publicadora: Sony Interactive Entertainment 

Plataforma: Playstation 4 

Duração: Média de 20 à 30 horas 

Lançamento: 19 de Junho de 2020 

Elenco: Ashley Johnson, Laura Bailey, Troy Baker, Jeffrey Pierce, Jeffrey Wright, Shannon Woodward, Stephen Chang, Ashley Scott, Victoria Grace, Ian Alexander, Chelsea Tavares, Ashly Burch, Patrick Fugit e mais. 

Sinopse: Cinco anos após a perigosa jornada através dos Estados Unidos pós-pandêmico, Ellie e Joel se acomodaram em Jackson, Wyoming. Viver em uma próspera comunidade de sobreviventes permitiu que eles tivessem paz e estabilidade, apesar da constante ameaça de infectados e outros sobreviventes desesperados. Quando um evento violento interrompe essa paz, Ellie embarca em uma jornada implacável, em busca de justiça. Conforme ela caça os responsáveis um por um, ela é confrontada pela devastadora repercussão física e emocional de suas ações.

Trailer:
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