Elsewhere – A Flor Azul (2018, de Guilherme Pedra)


Há séculos o ser humano visa lidar com a inevitabilidade da morte, compreender seu propósito e dar-lhe um sentido para não enlouquecer completamente. Escritores dos mais clássicos a poetas, músicos e artistas plásticos; filósofos, biólogos e religiosos, todos tentam explicar e ressignificar a morte. Enquanto algumas culturas veem na perda uma oportunidade de celebrar a vida, outras tantas se valem de rituais de homenagem e luto por aqueles que se foram. O que não se pode negar é que a morte de alguém querido causa um enorme vazio e sofrimento naqueles que ficam, deixando para estes a simples e decisiva escolha de como agir a partir dessa circunstância. E é exatamente esse o ponto que Elsewhere (A Flor Azul) contempla em sua narrativa.


Uma delicadeza extremamente poética permeia o curta ao longo do processo de se redescobrir a partir da dor — e apesar dela — vivido pela jovem artista Luna (Ana Moioli), após a morte do irmão Antonio (Guilherme Pedra). Já em sua cena inicial somos transportados através de uma tela em branco à uma praia inebriante, de tão bela, na qual ambos passeiam sem sinal de qualquer outra pessoa por perto — transmitindo uma sensação não de solidão, mas de um sonho compartilhado, do qual o espectador se sente parte.




E é em meio a um momento de doçura e carinho entre eles que Antonio presenteia a irmã com seu livro de poesia intitulado Epitáfio — impossível não lembrar da música homônima dos Titãs, que se refere às frases escritas em lápides como forma de homenagem à pessoa que ali repousa. A partir desse ponto, a narração em off do poema acompanha Luna em sua jornada, tentando se reerguer e se utilizar da arte como mecanismo de cura, no qual não existe tempo, lugar ou doença; apenas o aqui e agora. E é através de sua arte que consegue suplantar o impossível e se (re)encontrar.


Com uma trilha sonora original impecável,  que pincela o tom do filme desde suas primeiras notas  atuações delineadas nos mínimos detalhes, roteiro em nada verborrágico, uma direção que foge do óbvio e uma fotografia tão belíssima que cada frame poderia ser emoldurado como obra por si só — além de capturar perfeitamente o espectro emocional das personagens e trabalhar uma paleta de tons frios, predominando o azul, que casa perfeitamente com o tema abordado, coroando o trabalho de câmera  e trazendo a aura do filme quase como um personagem recorrente — o curta parece fazer um tributo à arte como um todo. Desde o poema que acompanha o arco dramático de Luna, a trilha sonora, as atuações, o desenho e a pintura que marcam a personalidade da protagonista até a própria realização cinematográfica em si, Elsewhere é uma metalinguagem constante. 




Apesar de abordar um assunto complexo e que evoca sentimentos tristes e dolorosos, Elsewhere consegue tocar o público com sua contemplação da vida e da arte — a vida na arte, talvez? — e sua visão inspiradora e vital de algo tão temido e ainda sim tão intrínseco à humanidade: sua própria finitude. 


“O céu está caindo sob nossas cabeças. E tudo o que resta é a arte do nosso presente”. Em entrevista à Indie Activity, o diretor revela que o curta realizado em uma aula de produção na New York University nasceu de um sentimento muito pessoal e da vontade de escrever uma história sobre o poder da arte e como ela pode ser utilizada como mecanismo de cura. A relação entre irmãos era outro fator que queria abordar, por sentir saudade da irmã — que reside no Brasil, país de origem de Guilherme. E em pouco menos de 14 minutos, Guilherme Pedra consegue transmitir com maestria a mensagem a que se propôs. O próprio poema de Antonio, salve algumas adaptações de palavras, foi escrito por um amigo próximo do diretor em um caderno compartilhado entre ambos, trazendo ainda mais pessoalidade à obra.




Vencedor do American Student Film Festival de 2018 como melhor curta, melhor diretor e melhor atriz, o filme ainda recebeu menções honrosas em outros festivais, como o de curta de Cannes, e foi premiado no Best Shorts Competition em 2018, Brazil International Film Festival em 2019 e foi semifinalista no LA Cinefest. 


O diretor vem trabalhando agora em seu segundo curta-metragem, I Am Love, que conta a história do solitário Arthur, um músico em Nova York que está lutando para completar sua composição e, em sua busca, passa a se corresponder com uma jovem artista que nunca viu pessoalmente, Luna — sim, a protagonista de Elsewhere— e ao seguir o som de uma bela melodia vindo da casa vizinha, é levado a se questionar sobre a possibilidade de amar mais de uma pessoa ao mesmo tempo. Perpetuando sua abordagem poética acerca das artes e trazendo Ana Moioli novamente no papel de Luna, o filme tem previsão para sair ainda em 2020.  





Título Original: Elsewhere (A Flor Azul)


Direção: Guilherme Pedra


Duração: 14 minutos


Elenco: Ana Moioli e Guilherme Pedra


Sinopse: Quando a jovem artista Luna perde o irmão mais velho, precisa superar o sentimento de luto através de sua arte. 


Trailer:

Elsewhere – A Flor Azul (Official Trailer) from Guilherme Pedra on Vimeo.

O que vocês acharam da história? Ansiosos para as próximas produções do diretor brasileiro? Deixa aí embaixo seu comentário e vai lá assistir Elsewhere 😄🌸

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