Especial: Mulheres no Cinema – Parte 2


        Laís Bodansky é formada em comunicação social com habilitação em Cinema na FAAP, São Paulo. Ela se destacou por seu curta-metragem universitário: Cartão Vermelho, que foi quando estreou na direção. O curta pode ser encontrado facilmente hoje na internet, no YouTube.
          Este curta foi selecionado para o New York Film Festival em 1995. Mas o grande reconhecimento mesmo se deu após a realização de seu longa Bicho de Sete Cabeças (2001), uma co-produção entre Brasil (Buriti Filmes, Dezenove e Gullane) e Itália (Fábrica Cinema – Marco Muller). O filme foi aclamado, premiado e alavancou a carreira do ator Rodrigo Santoro, que ficou em evidência. 

          Como Nossos Pais foi seu quarto longa e teve a première no Festival de Berlim (Panorama Special) de 2017. Foi o filme brasileiro mais premiado daquele ano e fomentou altas discussões feministas positivamente. 

Trailer:

             Outros filmes aclamados da cineasta são: Chega de Saudade (2007), que foi uma co-produção com a França; e As Melhores Coisas do Mundo (2010), que estreou no Festival de Roma. Além de já conter em sua trajetória documentários para cinema e televisão. 

                  

         Laís é também sócia do cineasta Luis Bolognesi na produtora Buriti Filmes, assinando a produção de seus longas: Uma História de Amor e Fúria ExPajé. E em fevereiro de 2019 Laís foi anunciada como a nova presidente do Spcine: empresa municipal de fomento ao audiovisual na cidade de São Paulo. 

                 Vamos dar destaque para o filme mais recente da cineasta: Como Nossos Pais (2017), que contou com sua atuação não só na direção mas também no roteiro desta vez. 


               Sempre senti uma certa aproximação do estilo de decupagem que Laís adota em relação ao de Anna Muylaerte. Acho que possuem um viés estético parecido, pois dificilmente fazem planos mais fechados, preferindo privilegiar sempre planos mais abrangentes, fazendo do espectador, então, um voyeur. Somos convidados para adentrar àquele recinto e ver como se dão aquelas relações sociais. É quase como um estudo antropológico. Nós, espectadores, entramos naquele ambiente e vemos o que elas, como diretoras, querem que vejamos. Somos testemunhas oculares de situações e rotinas de personagens de um meio específico. 

                 Laís consegue explorar muito bem os ambientes do filme e em Como Nossos Pais o visual do cenário é clean, traz claridade e geralmente arejado, principalmente na casa da mãe da protagonista. 

                     A história é de Rosa, uma mulher por volta de seus 30 e poucos anos que precisa lidar com a família “antiga” e a família “nova”, ou seja, com a mãe e com as filhas, além do marido e também seu trabalho. Laís diz que queria falar sobre este momento da vida específico – e o que o mesmo representa para as mulheres – porque muitas vezes a cineasta se sente neste lugar. É como se fosse a “idade sanduíche”, a mulher precisa ser mãe e filha ao mesmo tempo, e precisa saber equilibrar as coisas, saber agir como cada qual em seu devido momento, e isso é realmente muito complicado. E claro, equilibrar isso com o trabalho e com a vida de casada é insano também. 


                     Sendo mãe, filha, e trabalhadora, há sempre aquela cobrança de prover uma vida decente para as filhas, e também ser a filha presente na vida já desgastada dos pais. E embora façamos de tudo para dar nosso melhor, nem sempre acertamos.


                   Rosa tem uma relação espinhosa com a mãe, porque julga muito suas escolhas e seu modo de tê-la criado, mas a verdade é que os pais tentam fazer o melhor com o melhor que podem oferecer, e mesmo assim às vezes podem falhar, mas erram tentando acertar. E talvez por isso que o filme se chame Como Nossos Pais, além de fazer uma referência à música de Belchior, que acabou sendo mais eternizada na voz de Elis Regina; o filme também fala sobre essa vontade de querer “se afastar” do modo que os nossos pais fazem ou fizeram as coisas, na incessante procura de sermos melhores versões deles inclusive no quesito paternidade/maternidade. Porém, inevitavelmente, pais são pais, e apesar de cada um ter a sua individualidade, os pais acabam caindo nos mesmos clichês porque, afinal, não deve ser uma coisa fácil, né? No final das contas é preciso saber que “apesar de termos feito tudo o que fizemos ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais”. 

                      Ter de parecer a mulher maravilha o tempo todo é algo muito esperado da mulher, que deve agradar aos pais, aos filhos, as pessoas no trabalho e o marido. Nunca falhar, nunca poder dizer “não” ou desabar em prantos (porque aí já é considerado histeria). Deve contentar a todos, mas nunca contentar a si mesma, nem dar prazer a si mesma. As mulheres, principalmente as de trinta anos em diante, sempre vão se colocando em terceiro, quarto, quinto lugar, até não conseguirem mais encaixar-se em sua própria vida. 

                Nossa protagonista Rosa percebe que há um desequilíbrio e desigualdade na relação que tem com seu marido, Dado, interpretado por Paulinho Vilhena. Num almoço em família a mãe de Rosa defende Dado e seu trabalho mega humanista de ser antropólogo e viver estudando outras culturas, e ajudando a defender a Amazônia. Rosa acha tudo o que o marido pra lindo, mas sabe que é só na teoria, pois ela exige que na prática ele não é este homem presente e desconstruído. Dado é estilo aqueles caras esquerdo-machos que acreditam que estão totalmente fora da qualificação de machistas, e querem/precisam muito pagar de “legais”. Rosa quer que ele e sua mãe entendam que ele poderia cumprir com seus deveres de pai e também cuidar do lar que compartilham, onde ele sequer lava um prato. 


                 A mãe de Rosa gosta de vender a imagem de ser a frente de seu tempo, e nada tradicional, mas discorda que a filha deve cobrar o marido, porque, nas entrelinhas ela deixa escapar aquela velha noção de que cuidar das filhas e da casa seria uma função dela como mulher. Rosa, por sua vez, também procura ser uma mulher muito desconstruída, mas acaba se assemelhando a sua mãe quando censura um beijo de sua meia-irmã com a namorada dela, pois diz que não queria que suas filhas vissem isso. Portanto, mais uma vez aqui, fica claro o porquê da escolha do nome do filme. Às vezes nos achamos muito distantes dos nossos pais, mas a verdade é que pode ser que estejamos num ciclo vicioso, e não sejamos tão diferentes assim, tanto para as coisas boas e as ruins também. 

                   Rosa está entrando em colapso há um bom tempo porque não pode deixar a peteca cair no trabalho (que odeia), nem com as filhas, nem com o marido (cuja relação percebe-se que está abalada há tempos), e com sua mãe, relação que parece que nunca foi harmônica. Soma-se a isso tudo a preocupação constante que tem com seu pai, com quem sempre banca a babá. Ele é um homem que vive no mundo da lua e que traiu sua mãe, e hoje é casado com uma mulher mais jovem, com quem hoje tem uma filha adolescente. Aliás, Rosa sempre defende o pai, mesmo sabendo de seu histórico, e a mãe de Rosa defende Dado, o marido de Rosa. Há muito protecionismo e hipocrisia afinal de contas, não é? Aí está o ciclo evidenciado outra vez. 


                      A protagonista já não está levando a vida que sonhara, mas tudo abala-se mais ainda quando sua mãe lhe diz que ela é filha de outro homem, com quem teve um caso rápido uma vez, em Cuba. E que hoje o cara é um político importante em Brasília. Rosa entra em crise e se demite do emprego. Tem uma crise no casamento, e decide que precisa, antes de mais nada, de um tempo para ela. Precisa descobrir quem ela é. E aí começa a jornada do autoconhecimento de Rosa, que é super necessária para todas as mulheres, seja na idade que for.

Outros filmes da cineasta: 

      


E aí, caro leitor? O que me diz sobre Laís Bodansky?
Curta, comente e compartilhe!


       

   

Deixe uma resposta