Crítica: Amores Imaginários (2011, de Xavier Dolan)

Em seu primeiro filme, Eu Matei Minha Mãe, Xavier Dolan já demonstrava sinais de seu gosto por narrativas fragmentadas e desenvolvidas de formas pouco convencionais. Considerando que a trama – tanto de sua primeira produção quanto a de Amores Imaginários – é bastante simples, isso faz total sentido, afinal é necessário algo que torne possível a distinção entre essas e outras obras com histórias similares. Essas características são maximizadas em Amores Imaginários através de um nível muito maior de exageros, atalhos e elementos abstratos, além de uma trama muitíssimo mais aberta. É um filme que pede concessões e então demonstra a confiança para carregar seu modo de execução até o final.
O conflito de Amores Imaginários se dá dentro da relação entre Francis (Xavier Dolan), um rapaz gay, sua melhor amiga, Marie (Monia Chokri) e o objeto de adoração dos dois: Nicolas (Niels Schneider). Em algumas ocasiões, o filme entra em um formato de entrevistas e passamos alguns minutos ouvindo histórias e declarações de estranhos sobre amor e relacionamentos. Esse formato cria um contraste entre o mergulho nos personagens da trama principal e a atenção voltada para o mundo exterior, sugerindo um certo tipo de consciência por parte do roteiro de que uma história é importante porque é tratada de forma importante, mas que sempre existem outros relatos e outras situações igualmente importantes para aqueles que as vivem.

O primeiro ponto de interesse na forma como Dolan executa sua premissa é o espaço que temos para preencher sozinhos, já que a história começa com uma rivalidade praticamente instantânea entre Francis e Marie (apesar de uma suposta grande amizade entre os dois). Se Dolan renega o controle da história nesse sentido, ele se sente no direito de explorar a mente de seus personagens através de cores, músicas, montagens e qualquer outro artifício que nos permita visualizar suas emoções sem precisarmos de uma explicação exata. Ao mesmo tempo em que a obra evita resoluções óbvias e cria certo desconforto através de seus exageros, essas escolhas levam a um sentimento de ápice constate, de sempre estarmos envolvidos em algo maior e que não entendemos completamente.

Se Francis e Marie não ganham muito espaço para apresentações, o que dizer de Nicolas? Acredito que a razão pela qual ele é um objeto de adoração tão forte dos personagens é justamente sua aura infinita de egocentrismo. A sensação que o personagem cria é de ausência mental e de alguém que está sempre perdido em seus próprios pensamentos, algo que o torna imediatamente um símbolo de inocência e mistério. Para além disso, o fato de que a história já começa diretamente dentro do conflito que o envolve faz parecer com que a vida dos outros personagens só começou realmente quando ele apareceu, alimentando ainda mais o sentimento de abstração e idealização ao redor de sua figura.

Dolan anda no limite de uma pretensiosidade aparentemente ingênua e ao mesmo tempo divertida – é fácil perceber sua paixão e desejo de criar algo diferente, mesmo que seus excessos às vezes incomodem. O uso repetido das mesmas músicas na trilha sonora parece criar um tom cíclico na obra, como se os personagens estivessem fadados a voltar de novo e de novo para um mesmo momento até finalmente perceberem que a solução de seus problemas nunca foi um rapaz de cabelos cacheados e olhos verdes, mas uma análise difícil e verdadeira de quem eles realmente eram. Até essa dificuldade ser superada, a vida continua e as frustrações seguem, apenas projetadas em pessoas diferentes.

O senso maior em tudo isso é que o diretor realmente aprecia o que está fazendo e nos convida para um jogo, um exercício de identificação com seus personagens. Em meio a tantas regras de escrita e convenções, de uma eficiência máxima e quase neutralizadora, se permitir apreciar os visuais e a trilha sonora de uma produção carregada de vontade e exuberância não é apenas divertido, engraçado e intenso, mas ultimamente possibilita que imaginemos nossos próprios problemas se desenvolvendo em câmera lenta, com cores fortes e um senso de grandiosidade em tudo que fazemos. Para Xavier Dolan, esse certamente parece ser o caso.

Título Original: Les Amours Imaginaires

Direção: Xavier Dolan

Duração: 95 minutos

Elenco: Monia Chokri, Niels Schneider, Xavier Dolan

Sinopse: Francis e Marie são amigos inseparáveis. No entanto, suas vidas mudam quando conhecem Nicolas, charmoso rapaz do interior que acaba de se mudar para Montreal. Um encontro se sucede ao outro – seriam eles imaginários? – e os três logo se tornam um grupo inseparável. Mas Francis e Marie, ambos apaixonados por Nicolas, desenvolvem fantasias obsessivas em torno de seu objeto de desejo comum. À medida que atravessam as típicas fases da paixão, embarcam numa verdadeira disputa pela atenção do rapaz, comprometendo sua antiga amizade.


Trailer:

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