A Equipe do Blog Comenta: Game of Thrones S08E04 – The Last of The Starks (2019, de David Benioff e D.B. Weiss)


AVISO: esta crítica contém spoilers


Após o polêmico episódio The Long Night, tivemos The Last of The Starks. Na expectativa de que este encaminhasse a série para seus momentos finais, e o tão esperado embate com Cersei, as expectativas, embora agora mais dosadas nesse domingo, estavam na forma de fazer a série passar por um processo de redenção e voltar aos seus tempos de glória, mas parece que fora tão polêmico quanto seu anterior. Em vista disso, alguns membros da equipe do blog teceram alguns comentários sobre o quarto episódio da temporada.
Guilherme Amado comenta:

Um dos conselhos mais interessantes sobre escrita é que as obras que mais nos ensinam não são os grandes clássicos, mas sim tramas que não foram bem desenvolvidas. Através desses trabalhos, podemos perceber falhas e evitá-las nas tramas que escrevemos. Conforme o roteiro de The Last of the Starks sangrava como uma ferida aberta, percebi naquela confusão toda um princípio essencial da escrita e que talvez nos ajude a entender porque essa temporada está sendo tão frustrante: os momentos de uma trama serão tão bons quanto o caminho até eles.

Em teoria, não há nada de errado com os acontecimentos de Game of Thrones. Os conflitos escolhidos são, em grande parte, progressões naturais dos caminhos que os personagens trilham há vários anos. A questão é que os escritores não parecem ter qualquer vontade de desenvolver as consequências emocionais desses acontecimentos – da mesma forma que o Rei da Noite veio e foi em um episódio, aqui temos revelações importantes feitas offscreen, promessas feitas em uma cena e quebradas na próxima e o já conhecido fast travel da série. Se os próprios escritores não se importam com os acontecimentos, por que nós deveríamos?

As escolhas feitas com relação ao tempo reduzido da temporada também não me parecem muito estratégicas. O que aprendemos de novo sobre os personagens na infinita sequência da celebração em Winterfell? Faz sentido passarmos tanto tempo nisso quando o resto do episódio é tão absurdamente apressado? A lista de problemas é infinita: Daenerys não poderia ter visto a frota de Euron do alto? Como foi que subitamente todos já sabiam que Missandei – e apenas ela – havia sido sequestrada? É compreensível o apego de alguns fãs a detalhes mínimos quando consideramos o nível crescente de inconsistências e arbitrariedades presentes em cada cena.


O melhor momento do episódio – a conversa entre Varys e Tyrion sobre Daenerys – também é afetado pelo fato de que a série não dá tempo algum para Tyrion expor as razões pelas quais ele está tão obviamente fora de si. Se ele, que foi um personagem principal por muitas temporadas, não tem o tempo que precisa, o que dizer de Varys? As posições dos dois são interessantes e acredito que o conflito é fascinante, mas quanto tempo os dois terão para desenvolver isso? Falando sobre Daenerys, cada vez que lembro que supostamente ela e Jon se amam e querem muito ficar juntos, surge um grande ponto de interrogação em minha cabeça. Quando que existiu alguma verdade nesse relacionamento, para além das conveniências da trama? É imensamente triste que esse seja o fim de personagens marcados por relacionamentos amorosos tão significativos em outras temporadas.

Talvez o momento que torne mais claro o fato de que os escritores não entendem esses personagens é a declaração de Sansa romantizando o abuso que sofreu nas últimas temporadas. O que dizer de Cersei, então? Ao contrário do Rei da Noite, ela foi desenvolvida em temporadas anteriores, mas a série parece querer abandonar qualquer sentido de nuance em favor de mais uma vilã que irá levar, ao que parece, a mais um final não apenas previsível, mas ultimamente irrelevante. No fim das contas, parece que Game of Thrones não está nem mais tentando.





Igor Motta comenta:
Depois do fiasco que foi The Long Night, o quarto episódio da temporada final de Game of Thrones tinha a tarefa moral de se redimir com os fãs. Claro, tarefa essa que, nas atuais situações da série, parece impossível. E devo dizer, não foi alcançada. No geral, The Last of The Starks foi melhor do que seu antecessor. Algumas mortes importantes aconteceram e tentou seguir o que resta para fechar os arcos dos personagens sobreviventes: a batalha pelo trono de ferro. Mas fez isso de forma rasa, quase que reivindicando seu status de fanfic da HBO.

Começando pelo pior ponto: nada se compara ao
encadeamento lógico de acontecimentos. Temos uma falta completa deles,
na realidade, como não ver uma frota toda de navios de guerra
quando voando em um dragão, ou a penetração fácil do corpo da famigerada criatura cuspidora de fogo, como se as escamas não fossem nada. A reação de Euron ao
ouvir, e espero que descobrir, que Tyrion sabia da gravidez de Cersei,
informação esta que havia recebido poucas horas antes, foi neutra demais
para um personagem tão sagaz.

 

O episódio segue, talvez até aumenta, os efeitos apontados nos episódios anteriores, o fato de que a própria mitologia da série é ignorada. Alguns personagens parecem tomar decisões que vão contra sua própria construção. Voltando à impressão de que alguns pontos da série são construídos e forçados para atender aos momentos de clímax, como se o importante fosse somente o destino, e toda a trajetória um mero detalhe sem importância.

O exemplo disso está na construção de Jaime, que fora completamente ignorada para retornar o personagem para o posto anterior, de seguir sua vida em função de Cersei. Qual o real sentido disso? Cumprir uma profecia e bater o martelo de Jaime como valonkar? Ou só gerar uma tensão inexistente para fazer outro personagem surgir das cinzas e solucionar o conflito em apenas um episódio? E Arya, cobrando Jon Snow de comportar-se pensando na família em primeiro lugar para vinte minutos depois abandonar Winterfell para nunca mais voltar? A famosa dupla D&D parece perdida em meio emaranhado de destinos que precisavam lidar, e o resultado é catastrófico.

Ainda nessa “forçação de barra” de personagens para cumprir alguma situação climática, temos a maior de todas em Daenerys. Desde a sétima temporada,  vimos o arco da personagem ser reduzido ao motor de acontecimentos para Jon Snow. O favoritismo do bastardo, agora legitimado e quase rei de Westeros, fica cada episódio mais evidente e difícil de suportar. A narrativa da rainha louca e do rei justo ser aquele que não quer ser rei, parecem extremamente oportunas para um roteiro que condecora cada vez mais o personagem, distanciando-se daquela série que matara Robb Stark e Oberyn Martel para provar sua falta de favoritismo.
A produção da temporada durou dois anos, tempo que, visto as temporadas anteriores, parecia mais do que o suficiente para entregar algo digno e bem feito, mas parece que tivemos o completo oposto. Cenas corridas ao ponto de existir um copo da empresa Starbuks, a justificativa do diretor do episódio de que a polêmica cena de despedida de Fantasma fora daquela forma por, simplesmente, ter menos trabalho. O planejamento da temporada final parece que estava muito além das capacidades de D&D.


O que deixo aqui como ponto positivo está na cena final e nas últimas palavras de Missandei. Na breve, e quase fantasmagórica, referência de acontecimentos anteriores feita de forma coerente, a palavra dracarys não tinha melhor contexto do que aquele. Dracarys, além de significar fogo em alto valiriano, não somente fora uma palavra para mencionar sua inevitável morte e para
que Daenerys e Verme Cinzento a vingassem da forma mais targaryen
possível, mas também carregada de mais significados. Significados estes
que me fizeram até ter um arrepio na coluna, recobrando uma história com
referências de sua própria mitologia.

Dracarys, para todos os escravos
libertos em Astapor, passou a significar também liberdade e resistência, cena maravilhosa do episódio And Now His Watch Is Ended. Missandei, com uma palavra de mil significados oportunos e bem encaixados para a cena, salvou o episódio do completo fracasso. Teve seus inúmeros problemas, mas este ponto foi o que deu
algum fôlego para Game of Thrones tentar recuperar o que já fora. Sem muitas esperanças, mas com uma
pequena fagulha de outrora.





Título Original: Game of Thrones




Direção: David Benioff e D.B. Weiss


Episódios: 6


Duração: 60 minutos em média


Elenco: Emilia Clarke, Kit Harinton, Peter Dinklage, Lena Headey, Sophie Tuner e Nicolaj Coster-Waldau e outros.



Sinopse: A batalha por Winterfell acabou, deixando uma trilha de corpos para queimar e sobreviventes para comemorar. Em meio ao novo capítulo da história de Westeros, o conflito pelo trono de ferro parece caminhar para seu derradeiro e violento fim.

Trailer da temporada:
Promo do quinto episódio:




“[…]- Imaculados! – Dany galopou à frente deles, com a trança de um
louro prateado esvoaçando atrás, e a sineta tilintando a cada passo. –
Matem os Bons Mestres, matem os soldados, matem todos os homens que usem
um tokar ou tenham um chicote nas mãos, mas não façam mal a nenhuma
criança com menos de doze anos, e arranquem as correntes de todos os
escravos que virem. – Ergueu os dedos da harpia… e então atirou o
açoite para longe. – Liberdade! – entoou. – Dracarys! Dracarys!
– Dracarys! – gritaram eles em resposta, a mais bela palavra que já ouviram. – Dracarys! Dracarys!
E por toda a sua volta, feitores fugiam, soluçavam, suplicavam e morriam, e o ar poeirento encheu-se de lanças e fogo.”

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