A Equipe do Blog Comenta: Game of Thrones S08E03 – The Long Night (2019, de David Benioff e D.B. Weiss)

AVISO: Esta crítica contém spoilers

Finalmente, o inverno. O episódio desta semana, na culminação de oito anos de série, cinco livros e a expectativa de fãs de ambas as versões, mostrou uma hora e vinte minutos de nossos personagens preferidos defendendo Winterfell e Westeros do Rei da Noite, o grande antagonista da história. Nas promessa da própria produção de ser a maior batalha já exibida na história da televisão, o episódio recebera críticas bem mistas, para não dizer contrastantes e, principalmente, conflitantes. Odiado por uns e amado por outros, alguns membros da equipe do blog decidiram comentar suas opiniões e impressões sobre o episódio que marca o meio da temporada final de Game of Thrones.


Guilherme Amado comenta:


Se antes a problemática de Game of Thrones era o crescente descaso com o material em que é baseado, nessa última temporada os criadores – e grande parte dos fãs – parecem ter entrado em uma loucura crescente com os números e detalhes sobre a grandiosidade da produção. Em nenhum outro episódio os efeitos técnicos e logísticos da série se mostram tão imensos e ao mesmo tempo tão sem propósito, tão desprovidos da vida que um dia habitou a série e que a tornou o fenômeno que é hoje. 


De uma forma, o pesadelo de Winterfell foi meu próprio pesadelo: uma série anteriormente competente que agora se contenta com um roteiro cuja escrita é a nível de primeiro rascunho. O problema agora não é que o material original foi abandonado em favor de caricaturas dos personagens, mas sim a maneira preguiçosa escolhida para resolver – ou melhor, eliminar – a trama central das últimas temporadas.

É importante esclarecer que o caos da batalha não é necessariamente ruim – os livros são cheios de momentos em que os personagens tomam decisões que os afastam do caminho esperado ou criam um senso de confusão. A questão é que a estruturação desses momentos ao redor da lógica interna dos personagens faz com que os acontecimentos não pareçam como decisões de alguém sentado na frente de um computador. Para além da inabilidade de criar essa sensação efetivamente, os escritores sacrificam ainda mais a coerência em favor do fator cool e depois tentam usar obscuridades e omissões para tapar os buracos que ficam. 


Da mesma forma que os leitores entendem as dificuldades de Martin na escrita dos livros, os fãs da série se solidarizam com as complicações na produção, algo explícito em momentos como a chegada de Daenerys e Jon a Winterfell há algumas semanas. Bran casualmente menciona que o Rei da Noite agora controla Viserion e ninguém esboça reação alguma – certamente deve ser pela falta de tempo, não? 

Fica um pouco difícil de aceitar isso quando o mesmo episódio conta com uma sequência gratuita na qual Jon voa em Rhaegal como se ele fosse um animal qualquer e não uma criatura que a própria Daenerys já teve dificuldades em controlar. Tudo isso porque nós tínhamos que ter uma sequência em que os criadores pudessem justificar as montanhas de dinheiro investidas na série, dar algum assunto interessante para o especial pós-episódio da HBO e ainda tirar do caminho o fato de que Jon precisaria usar o dragão em episódios subsequentes. 


O que Game of Thrones perde com esses erros é seu senso de relevância narrativa. Se antes conseguíamos ignorar as incongruências em favor de um final supostamente satisfatório, como continuar quando os escritores sequer se importam com os conflitos que escolheram para a história? Se você olhar para o céu de Winterfell, talvez seja possível ver o último fiapo de credibilidade da série – já cortado – sendo jogado ao vento para talvez repousar no corpo de um dos personagens secundários mortos na tentativa de criar um senso mínimo de consequência em um episódio que quer muito parecer importante e ao mesmo tempo não tem a coragem de tomar nenhuma decisão significativa. 


Finalmente, temos também a criação desesperada de todos os casais possíveis para que a série possa terminar, talvez, como uma novela da Globo. Ao tornar tão exposta a fragilidade da trama, Benioff / Weiss confirmam que nenhuma morte de personagem é tão trágica quando a constatação de que os mesmos existem agora apenas como escravos de uma arbitrariedade que os reduziu a ecos fantasmagóricos de sua complexidade inicial.

Igor Motta comenta:

Sem delongas, o episódio foi ruim. As promessas da maior batalha já televisionada, junto com a expectativa que somente Game of Thrones conseguira acumular em toda a história do audiovisual, fizeram de The Long Night um episódio de produções épicas, mas uma história sem pé e sem cabeça.
Foram 55 dias de gravações, um orçamento recorde e a junção de inúmeros personagens e arcos para, apenas, uma hora e vinte minutos de duração. As chances de dar certo existiam, e eram bem razoáveis. Os dois episódios anteriores nos prepararam para esse momento, aliás, toda a série sempre circundou o fato de que o medo era para o inverno, a própria justificativa da muralha existir e a gloriosa cena em Hardhome, uma das melhores de toda a série. Mas, quando finalmente chegou, teve seu fim tão breve que até contrasta com sua demora. Atingiu seu ápice e terminou no mesmo episódio.

Os pontos ruins vão muito além de somente a resolução pobre, e repentina, do inverno, mais ainda do que qualquer comparação entre série e livros. A sensação que tive fora a de que deram tanta atenção para a expectativa do episódio que esqueceram de todo o resto. Em termos de produção, é notável que o preparo da batalha, figurino, filmagem, efeitos especiais e afins, estavam ótimos, mas tivemos o fiasco das cenas escuras que todos os fãs mal tinham a certeza do que estava acontecendo, causando reclamações na internet e o teste de capacidade de brilho de milhares de televisores do planeta. Algumas várias histórias de fantasia fizeram cenas de batalhas noturnas e incrivelmente melhores, mesmo que dezessete anos atrás (Helms Deep mandou um grande abraço pra HBO).

Mas a escuridão das cenas não foi o pior ponto. O que de fato matou o episódio foi o que deveria ser seu ponto forte, a alma das séries, principalmente a de Game of Thrones:  o roteiro. Esse fora repleto do que chamamos de deus ex machina, um artifício na escrita para soluções repentinas e mirabolantes em obras ficcionais.

Exemplo? Esse episódio todo é um exemplo, nas cenas em que os dragões atiram fogo na horda de mortos-vivos prestes a matar algum personagem querido,  Arya surgindo das trevas algumas várias vezes para salvar alguém, qualquer personagem para ajudar o Sam em todos os momentos dele na batalha, Jorah surgindo do absoluto nada para ajudar Daenerys… e a lista não termina.

A excessiva presença de deus ex machina acarreta na previsibilidade do episódio no ponto que mais dificulta o futuro andar da série: o destino dos personagens. Será que a atual produção da série seria capaz, ou teria a coragem, de fazer um casamento vermelho? Ou mesmo de matar Ned Stark? É notório que alguns personagens parecem mais protegidos do que outros, aquele famoso “poder de ser o protagonista”. As mortes do episódio poderiam, e deveriam, ser numerosas, mas foram escassas e pouco impactantes. Algum fã realmente lembrava da existência de Egg até a citação direta deste em A Knight of the Seven Kimgdons? Nem mesmo os animais de estimação, como Rhaegal, Drogon e Fantasma, que enfrentaram a guerra quase que como buchas de canhão, pereceram no conflito, já que aparecem na promo do episódio seguinte.


O peso dramático ficou todo nas costas da família Mormmount e em Theon.

Ainda, quase todos os personagens ali são veteranos de, pelo menos, alguma guerra. Nenhum deles pensou na possibilidade do Rei da Noite utilizar alguns membros
de seu colossal exército de mortos para soterrar um cerco incendiado
para conseguir passar? Realmente pensaram que as criptas, descanso final
de gerações e mais gerações de Starks mortos e seus servos, seria o
lugar mais seguro para guardar os indefesos? Jon e Daenerys realmente
fizeram algo de útil voando nos dragões em 70% do episódio?

Game of Thrones vive sob os corpos do que um dia fora, tentando tirar leite de pedra da outrora energia de imprevisibilidade que rodeava a série. Ainda temos a esperança de que nossos favoritos estejam, realmente, ameaçados pela situação apresentada, mas em The Long Night, ficou claro que não mais. Parecem outros personagens, de outra história, que dividem apenas semelhanças físicas com seus anteriores.

E aqui retomo, o problema não está nas comparações entre série e livros. O Rei da Noite era o vilão máximo, sendo uma entidade milenar que controlava uma estação mágica que cooptava todos os mortos, inclusive aqueles enterrados há gerações. Profecias foram feitas e declamadas por Melissandre e outros personagens para…bem, uma Arya ex machina salvar Westeros da Longa Noite, em pleno meio da temporada. 

Jogando
toda a construção de temporadas e temporadas sobre o inverno no lixo,
tivemos uma brusca curva nos rumos finais para que o embate final seja Cersei. Um episódio que possa até ser considerado parnasiano, preocupado com a forma, mas esvaziado de conteúdo, ainda que a própria forma esteja defasada pela incapacidade de se enxergar o que acontece nas cenas. The Long Night marca a morte mais polêmica de Game of Thrones: a da própria série.




Título Original: Game of Thrones



Direção: David Benioff e D.B. Weiss


Episódios: 6


Duração: 60 minutos em média


Elenco: Emilia Clarke, Kit Harinton, Peter Dinklage, Lena Headey, Sophie Tuner e Nicolaj Coster-Waldau e outros.



Sinopse: O Rei da Noite chega a Winterfel, e a grande batalha pelo destino de todos os habitantes de Westeros começa.


Trailer da temporada:


Promo do quarto episódio:


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