Crítica: Dumplin’ (2019, de Anne Fletcher)

Acho que começar a crítica dizendo que Dumplin’ é a versão que deu certo de Sierra Burgess Is a Loser é bastante apropriado! E se você não entendeu a referência, clique aqui para descobrir.

Que a sociedade exclui, humilha e massacra todos os que fogem do padrão preconceituosamente imposto não é novidade para ninguém, mas uma legião de revolucionárias está surgindo para dar um basta nesse sistema. 

Willowdean Dickson é uma jovem que está longe de ter as medidas que a sociedade julga necessária para ser considerada bonita. Sua mãe, Rosie, uma ex-miss que ainda está ligada com o concurso de beleza tradicional da cidade, qual já fora ganhadora 10 vezes, está inclusa nessa tal sociedade.

Rosie nunca falou nada que ofendesse a filha diretamente, mas o tratamento que tem com ela, consideravelmente frio comparado ao tratamento que dá para as participantes do concurso, dói mais em Willow do que se qualquer palavra fosse dita. 

Olhar para a mãe enquanto ela abraça outras garotas como se fossem dignas das maiores oportunidades do mundo só por serem magras e caberem em um vestido bonito, sendo que nunca teve qualquer tratamento parecido, dilacera e revolta o coração.


Para o bem de Willowdean, ela foi praticamente criada por sua tia, Lucy, que também estava longe de agradar os olhos da sociedade, mas não estava nem aí para isso! Era maravilhosa, por dentro e por fora! Possuía um carisma e autoconfiança que dava medo e inveja, até mesmo em sua irmã, Rosie! 

Lucy protegia Willow como uma leoa e não permitia que ela se sentisse mal com as ofensas dos outros, que vinham por todos os lados. Lucy sempre sabia o que dizer nos momentos certos. 

“O mundo está cheio de pessoas que vão querer dizer quem você é, mas é você quem decide, entendeu? Como Dolly diria “É difícil ser um diamante em um mundo cheio de strass.


Mas a vida nem sempre é justa e Willow acabou se encontrando sozinha num mundo onde sua tia não existia mais, e isso acabou abalando-a de tal forma que pôs sua autoconfiança à prova. 

Sua tia não estava mais por perto para enchê-la de palavras confiantes quando alguma coisa acontecia, então ela teve que pôr os ensinamentos em prática sozinha, com um leve empurrãozinho de sua melhor amiga, Ellen.


Antes que pensem, Ellen não é a garota magra, popular e burra que está ao lado de Willow só para balancear a história e uma contrapor a outra, bem longe disso, meus caros. Ela até pode estar mais próxima do padrão do que a amiga, mas tem um olhar muito puro que não a enxerga diferente, embora abrace as dores de Willow como se fossem suas. 

Aqui não tem esses clichês problemáticos à lá Sierra Burgess.
Ellen e Willowdean são amigas desde crianças, Lucy que as apresentou, e as três cultivaram juntas um fanatismo por Dolly Parton, tornando a cantora quase uma santa pelos ensinamentos e reflexões que suas músicas entregam.

“Descubra quem você é e seja de propósito!”
(Dolly Parton)




Para chamar a atenção da mãe, Willow acaba fazendo sua inscrição no concurso de beleza, afinal, não existia uma regra clara dizendo que gordas não podiam participar, era apenas a imposição social sobre o que é ser ou não bonita que as impedia.

Essa atitude despertou em outras garotas a vontade de fazer o mesmo, e logo o clubinho das revolucionárias é criado. Uma chama de vingança é acesa, mas logo vai se apagando na medida em que as garotas vão percebendo que podem, sim, fazerem parte daquele mundo caso aceitem enfrentar os olhos tortos das pessoas e mostrarem que são lindas e capazes como quaisquer outras, e que jamais alguma medida poderá ditar qualquer coisa sobre alguma pessoa.


 * Tradução: Todo corpo é um corpo de biquíni. 

Amar o próprio corpo é algo difícil e inseguranças vem e vão o tempo todo. Se aceitar como é parece que não está nos planos de ninguém, por mais que saibamos que seja a melhor opção seguir por esse caminho. Mas quando finalmente ficamos confortáveis com alguma coisa ou com alguma situação, surge outra quase que do nada, instantaneamente, para nos fazer entrar na batalha da aceitação novamente. 


A sociedade não nos ensinou a nos amarmos do jeito que somos. Temos e estamos aprendendo sozinhas e ainda fazendo com que as pessoas enxerguem o quão absurdamente elas agem em prol de… nada. Porque beleza não é absolutamente nada. 

Beleza não existe. Preferências existem. E preferir uma coisa não desmerece as demais e isso é algo que as pessoas precisam aprender de uma vez por todas!

Essas inseguranças podem ser vistas no filme de diversas formas, mas é mais fácil percebê-la na relação de Willow com Bo. Ela nem acredita e não entende como um cara como ele, “bonitão”, pode gostar dela. 


E nós falhamos como sociedade quando uma garota gorda passa por diversas batalhas internas ao se questionar o porquê de um garoto “inalcançável” estar querendo algo com ela. 

Nós falhamos quando a garota acha que no mundo real, o magro não fica com a gorda porque são formas que não se misturam. 

Isso é tão errado em tantos sentidos que é até difícil colocar em palavras tamanho desgosto pelo sofrimento que o preconceito causa, instalando uma insegurança desnecessária nas pessoas. 

Felizmente, o filme aborda e trabalha com esses assuntos de maneira saudável, não há problematizações que o desqualificam. Apesar de todos os problemas, é tudo muito humano.


Além do filme trabalhar de forma leve e descontraída a questão da quebra do padrão de beleza e o enfrentamento à gordofobia, é introduzido na história de maneira mais leve e descontraída ainda, as Drag Queens.


Sim, você leu certo! Drag Queens, eu disse.




Elas são introduzidas na história de forma tão genial que chega a surpreender! E estão em um papel tão empático, tão carismático, tão humano e tão lindo, que desmistifica a demonização que os preconceituosos as rotulam. 


Aqui, são as Drag Queens vestidas de Dolly Parton num club cheio de motoqueiros que darão todo o colo, apoio e ajuda que Willow e suas amigas vão precisar, principalmente após se inscreverem no concurso, já que não recebem o devido apoio de suas próprias famílias.


E só sendo muito ignorante para olhar para esse cenário e enxergar qualquer coisa que não seja amor, afeto, amizade.


Agora, tecnicamente falando, o filme tem uma fotografia simples e bonita, com uma paleta de cores vibrantes que representam muito bem esse mundo quase mágico que é quando você descobre que tudo bem ser você mesma. 


Tirando os figurinos das Drags, a produção não tenta surpreender muito com o figurino e maquiagem das outras meninas, é tudo bem simples e básico e eu acredito que isso tenha sido feito de propósito! Parece que o filme não quer dar margem para ninguém pensar “ó, viu só, se ela se arrumar até que fica bonita”, e ele está super certo em fazer isso, pois todas são lindas em sua forma natural, além disso, isso seria mais uma imposição social que as mulheres sofrem: estar sempre arrumadas, penteadas e maquiadas.




De todas as atuações, a que menos chama atenção é a de Jennifer Aniston, que faz o papel da mãe de Willowdean. Mas também não há muito espaço para ela brilhar, além do que, não é ela quem tem que brilhar aqui. Então vamos tê-la nesse filme como uma chamariz de público. Nisso sim sua participação funciona.


Danielle Macdonald, atriz que dá vida a Willowdean é a protagonista e é quem se destacada. Ela tem todo um carisma natural que flui muito com a sua personagem, tornando-a querida e verossímil. 


Os demais estão bem. Odeya Rush como Ellen, Bex Taylor-Klaus como Hannah, Maddie Baillio como Millie, até Luke Benward como Bo, estão todos bem confortáveis em seus papéis. O único esforço maior em relação à atuação, é o de Harold Perrineau Jr. interpretando uma das Drag Queens, fora isso, o filme mantém um ótimo padrão. Não há nuances de atores muito ruins e muito bons, o que é ótimo pois mantém o filme inteiro numa crescente verdadeira. 


Dito tudo isso, eu acho que você aí, leitor, já percebeu que nem só de bola fora vive a Netflix, não é mesmo? Tem produções originais que valem muito a pena! Como é o caso de Dumplin’.


P.s.: Dumplin’ é uma adaptação de um livro de mesmo nome e existem muitas divergências entre as duas obras. Esta crítica está levando em consideração apenas o filme.




Título Original: Dumplin’


Direção: Anne Fletcher


Duração: 110 minutos


Elenco: Bex Taylor-Klaus, Danielle Mcdonald, Jennifer Aniston, Luke Benward, Maddie Baillio, Odeya Rush, Andrew Fletcher, Ariana Guerra, Autumn Dial, Coley Campany, Dan Finnerty, Denitra Isler, Dove Cameron, Ginger Minj, Harold Perrineau Jr, Taegen Burns, Hilliary Begley, Georgie Flores e mais.


Sinopse: Willowdean é uma jovem que não se sente bem-vinda na sociedade e na vida de sua mãe. Após a trágica perda de sua tia, que lhe defendia de todos os males do mundo, Willow tenta por seus ensinamentos em prática para driblar todas as suas inseguranças para, assim, conquistar seu lugar no mundo.


Trailer:

E aí, curtiram esse filme? Gostaram da crítica?
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