O ódio que você passa para as crianças f* todo mundo.
Logo no início conheceremos Starr (sim, com dois “erres”) Carter (Amandla Stenberg). Ela está com sua família, composta por sua mãe, Lisa (Regina Hall), seu pai, Maverick (Russell Hornsby), seu meio irmão, Seven (Lamar Johnson) e seu irmão mais novo, Sekani (T. J. Wright). Eles estão à mesa e o pai explica sobre como devem se portar quando forem abordados pela polícia e, principalmente, por não estranharem caso sejam abordados de forma mais dura ou virem o pai sendo abordado dessa forma, mas que de maneira alguma devem se esquecer de seu valor, da honra de serem quem são e de seus direitos, utilizando para isso o Programa dos Dez Pontos dos Panteras Negras (clique aqui para ler). Pode parecer uma conversa extremamente pesada para se ter com os filhos, principalmente se estes forem crianças, mas quando você não conhece o perigoso mundo em que vive, sabendo exatamente o que ele vai lhe oferecer, corre-se o risco de ser tragado por ele.
“E se fosse em um bairro de brancos? E se fosse um cara branco de terno dirigindo uma Mercedes? Ele poderia ser um traficante, certo? (…) Você atiraria ou falaria “Mãos ao alto”?”
Mais do que nunca, o assunto está em voga, principalmente nos Estados Unidos, após a eleição de Donald Trump, que fora bastante apoiado por pessoas declaradamente racistas. Assim, se faz totalmente necessário discuti-lo, apontando as podres estruturas que embasam este comportamento, escancarando os problemas desde sua raiz. O filme aborda, de maneira muito segura e totalmente tocante, todo o ciclo que leva à uma tragédia como essa, começando na falta de oportunidades que uma criança tem nos subúrbios e como a vida no tráfico parece ser um caminho muito mais fácil para a tirar do mundo desequilibrado em que se encontra, seja por um lar desestruturado, seja por dificuldades financeiras e outros.
Em parte pelo excelente roteiro de Audrey Wells, que desejo fortemente que seja lembrado nas principais premiações e, ainda, por um elenco afiadíssimo, com grande destaque para Amandla Stenberg, que nos entrega nuances muito bem trabalhados de sua personagem, provocando-nos total empatia para com sua dor e seus momentos de alegria, o filme acerta em ser uma referência atual para levar à reflexão sobre o ódio semeado através do racismo e seu impacto na vida de todas as pessoas, principalmente das gerações vindouras.
Com uma fotografia fantástica, contrastando grandemente os ‘mundos’ que Starr está inserida, imprimindo cores fortes e quentes quando ela está em seu bairro com a família e vizinhança e cores frias para quando ela está em sua escola, e ainda com uma trilha sonora bem trabalhada, incluindo músicas de Tupac Shakur e Kendrick Lamar (grandes nomes do rap/ hip hop americano), o filme é uma obra completa, original e de fácil linguagem.
O único ponto que pode não agradar é o final do terceiro ato, que tem uma solução fácil demais e até mesmo pouco verossímil, mesmo que em nossos melhores sonhos, ela pudesse de fato existir e ocorrer na prática. Fica a impressão que a roteirista queria fazer um romance adolescente com um pano de fundo mais sério. A sorte é que o “pano de fundo” é tão bem trabalhado e desenvolvido, que o incômodo é pouco.
Atual, necessário e emocionante (eu chorei de encher balde, me tocou profundamente), O Ódio Que Você Semeia, assim como Infiltrado na Klan, se tornam títulos atuais obrigatórios para se ver e refletir sobre o mundo perigoso em que vivemos, que tende a se tornar cada vez mais intolerante à medida que as pessoas não discutem sobre os problemas enraizados na cultura, preferindo ignorá-los e/ou continuar alimentando-os.
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