Os filmes essenciais de Paul Thomas Anderson

Paul Thomas Anderson é um dos grandes diretores de sua geração. Com uma versatilidade marcante ao longa de sua filmografia, o cineasta transita com enorme segurança entre estilos opostos de cinema, tanto em temas explorados, quanto em gêneros e escolhas visuais, tanto na fotografia quanto na montagem.

Nascido na California no ano de 1970, PTA começou na indústria cinematográfica como assistente de produção em vários filmes de baixo orçamento entre o final dos anos 80 e início dos anos 90.

Em 1993, foi lançado seu primeiro curta-metragem, intitulado Cigarettes and Coffee, que foi premiado no festival de Sundance. Esse prêmio habilitou o diretor para desenvolver um filme no Sundance Institutes Filmmaker’s Workshops, o que resultou em Jogada de Risco (Hard Eight, de 1996), seu longa de estreia, que trata da relação entre um apostador experiente, seu aprendiz e uma garçonete pela qual ambos se apaixonam, e conta com nomes como Phillip Baker Hall, John C. Reilly, Gwyneth Paltrow, Samuel L. Jackson e Phillip Seymour Hoffman.

O filme estabeleceu Anderson como um dos cineastas mais promissores de sua geração, e essa expectativa foi confirmada logo em seu filme seguinte, lançado em 1997, que o tornou mundialmente famoso e o colocou na mesma prateleira de outros diretores renomados dos anos 90, como Quentin Tarantino e Kevin Smith.

1) Boogie Nights, de 1997

O filme que lançou Paul Thomas Anderson aos holofotes do cinema mundial foi Boogie Nights, épico sobre a indústria pornográfica americana dos anos 70 e 80, contado sob a ótica de Eddie “Dirk Diggler” Addams (Mark Wahlberg), um garçom de boate que se torna ator pornô após ser descoberto por Jack Horner (Burt Reynolds), um diretor que deseja revolucionar a indústria.

Clássica história de ascensão e queda, o longa chamou atenção pela maturidade precoce do cineasta ao conseguir lidar com uma quantidade enorme de personagens e dar personalidade e profundidade a quase todos. Além disso, a concepção visual do diretor para o filme também foi aclamada, e gerou comparações ao estilo de Martin Scorsese – principalmente por causa dos plano-sequências e movimentos de câmera – e sua narrativa foi comparada a Robert Altman – muito por causa da estrutura de contar várias histórias ao mesmo tempo, que acabou ficando carimbada como uma das marcas principais do cineasta responsável por Nashville e Mash, e viria a ser utilizada novamente e ainda mais explicitamente por Anderson em seu filme seguinte.

O elenco é gigante e conta com nomes de muito peso, além de outros que se tornaram famosos após a participação no filme. Juliane Moore, William H. Macy, Don Cheadle, John C. Reilly, Heather Graham, Alfred Molina, Phillip Baker Hall e Luis Guzmán – além dos já citados Mark Wahlberg e Burt Reynolds – são algumas das estrelas do filme.

A produção arrecadou 43 milhões de dólares na bilheteria, quase o triplo de seu orçamento de 15 milhões, e foi indicado ao Oscar nas categorias de Melhor Ator Coadjuvante (Burt Reynolds), Melhor Atriz Coadjuvante (Julianne Moore) e Melhor Roteiro Original. Esse sucesso deu respaldo ao diretor, que pôde realizar seu próximo filme com um orçamento maior e manter o controle criativo que teve em seus dois primeiros longas.

2) Magnólia, de 1999

Em Magnólia, lançado em 1999, PTA deu continuidade a sua parceria com alguns dos atores que participaram de seus filmes anteriores, como John C. Reilly, Juliane Moore, Phillip Seymour Hoffman, William H. Macy, Luis Guzmán, Melora Walters, Phillip Baker Hall e Alfred Molina. Além deles, entraram no bolo estrelas como Tom Cruise, Jason Robards, Melinda Dillon e Felicity Huffman.

No entanto, o tom do filme que sucedeu Boogie Nights não poderia ser mais diferente de seu antecessor. Se utilizando ainda mais explicitamente da estrutura que gerou comparações com Robert Altman, PTA explora um dia na vida de nove personagens nos arredores da rua Magnolia, localizada em San Fernando Valley, LA, que vivem dramas semelhantes e acabam tendo suas histórias conectadas por acaso.

Nesse drama de 3h de duração e repleto de simbolismos, o diretor conduz uma jornada emocionalmente carregada que trata de temas como culpa, arrependimento, traumas de infância, fracasso e, acima de tudo – segundo o próprio diretor – relações conturbadas entre pais e filhos, e como elas impactam nas vidas destes e das pessoas que os cercam.

Além de ter sido vencedor do Urso de Ouro no Festival de Berlim e indicado aos Oscars de Melhor Ator Coadjuvante (Tom Cruise), Melhor Canção Original e Melhor Roteiro Original, o longa também obteve uma bilheteria satisfatória. Apesar de seu elevado orçamento de 37 milhões de dólares, a arrecadação nas bilheterias foi de 48 milhões – ou seja, mesmo tendo gerado menos lucro que Boogie Nights, foi visto por ainda mais pessoas.

O filme foi um dos mais comentados de 1999, e gerou controvérsias comuns para obras tão cheias de simbolismos: enquanto alguns julgaram o filme como uma obra-prima, outros o acusaram de uma pretensão exagerada. Com o tempo, acabou se tornando um dos filmes mais icônicos dos anos 90 e da carreira de Paul Thomas Anderson.

3) Sangue Negro, de 2007

Após cinco anos distante das telonas – desde o ótimo Embriagado de Amor, de 2002 – o diretor retornou com um drama sobre Daniel Plainview (Day Lewis), magnata do petróleo que, após ser informado sobre um local possivelmente rico no material, chega a uma nova cidade e se vê obrigado a manter bom relacionamento com os habitantes do local e com o padre da igreja da cidade (Paul Dano).

Em Sangue Negro, considerado por muitos como sua obra-prima, PTA realiza um daqueles filmes que funciona em mais de uma forma: como um drama de época sobre a ascensão do capitalismo nos Estados Unidos no início do século XX, as promessas que esse trazia e não se realizaram, e como um dos estudos de personagem mais fascinantes da história do cinema – não que essas duas formas se anulem; pelo contrário, pois Plainview, um homem ganancioso, sem escrúpulos e disposto a fazer de tudo para que seu negócio cresça, pode facilmente ser considerado como a personificação do capitalismo.

E é impossível citar Sangue Negro sem discutir o trabalho de Daniel Day Lewis, que entrega uma das melhores performances de todos os tempos. Com uma presença opressiva e desconfortável, o ator constrói seu personagem em todos os detalhes: a forma como ele anda, a entonação de sua voz, o olhar cheio de desprezo, e, nos momentos de afeto com seu filho, H.W, tenta nos fazer ver algum tipo de humanidade dentro daquele homem.

Humanidade essa que, ao longo do filme, se torna cada vez menor, e isso é brilhantemente ilustrado pela fotografia, que retrata Daniel em sua natureza sombria, constantemente mergulhando o personagem na escuridão completa. Além disso, o filme marca a primeira trilha sonora composta por Jonny Greenwood – guitarrista do Radiohead – que já chega mostrando o porque de ser um dos principais compositores do cinema mundial ao entregar uma trilha descompassada e incômoda que reflete o interior do protagonista.

O filme recebeu oito indicações ao Oscar, inclusive a primeira de PTA para melhor direção, e venceu duas – Melhor Ator (Day Lewis) e Melhor Fotografia – tendo perdido nas categorias principais para Onde Os Fracos Não Tem Vez, dos irmãos Coen, outro filme espetacular lançado naquele ano. Mas isso passa longe de tirar o valor da obra-prima de Anderson sobre um homem movido por ódio, inveja, vingança, e, acima de tudo, condenado por sua própria maldade.

4) O Mestre, de 2012

Lançado em 2012, O Mestre cumpriu a árdua missão de suceder Sangue Negro na filmografia de Paul Thomas Anderson. Para ela, o diretor se aliou a nomes como Joaquin Phoenix, Amy Adams, Jesse Plemons, Rami Malek e Laura Dern, além de seu velho conhecido Phillip Seymour Hoffman.

O filme conta a história de Freddie (Phoenix), um soldado que volta da segunda guerra sofrendo de stress pós traumático e encontra Lancaster (Hoffman), o líder de uma nova religião chamada “A Causa”, se torna seu aprendiz e se junta a ele em viagens para divulgar seus ensinamentos.

Com o roteiro desenvolvido a partir de cenas não usadas dos primeiros rascunhos de Sangue Negro e histórias que Jason Robards contava no set de Magnolia sobre os dias que passava bebendo na marinha, O Mestre foi inspirado na história do escritor L. Ron Hubbard, o fundador da cientologia, e conta com cenas memoráveis, como aquela em que Lancaster submete Freddie pela primeira vez a um ritual do culto, o impedindo de piscar enquanto responde perguntas feitas pelo novo mestre.

As três indicações que o filme recebeu ao Oscar refletem aquela que talvez seja sua principal força: Melhor Ator (Joaquin Phoenix, talvez em seu melhor trabalho), Melhor Ator Coadjuvante (Phillip Seymour Hoffman) e Melhor Atriz Coadjuvante (Amy Adams). O filme não foi bem na bilheteria, tendo custado 32 milhões de dólares e arrecadado apenas 28, mas ficou marcado como mais um grande filme de Paul Thomas Anderson.

5) Trama Fantasma, de 2017

Três anos após Vício Inerente – lançado em 2014, após O Mestre – o diretor retomou sua parceria com Daniel Day Lewis e trouxe às telas um drama romântico à la anos 40 sobre o estilista Reynolds Woodcock (Day Lewis) e seu relacionamento com Alma (Vicky Krieps), uma jovem garçonete que adentra sua vida e desafia o status quo de seu universo.

Tocando em temas como o complexo de édipo, o vício em trabalho e a linha tênue entre a completa dedicação e o egocentrismo, Trama Fantasma tem como seu principal fio condutor as disputas dentro do relacionamento entre Reynolds e Alma, sejam elas internas – sobre o tempo dedicado ao outro ou as prioridades e preciosismos de cada um – ou externas – especialmente em relação à natureza contestadora de Alma, que gera conflitos indesejados por Reynolds e sua irmã, confidente e protetora, Cyril Woodcock (Lesley Manville).

Outra vez, um filme de PTA tem no elenco uma de suas principais forças. Se Daniel Day Lewis, em seu suposto último papel no cinema, brilha mais uma vez ao encarnar Reynolds como um homem cheio de manias que vê em seu trabalho um remédio para a carência que sente desde a morte de sua mãe, que o ensinou a costurar, e por isso se entrega ao ofício de corpo e alma, Vicky Krieps faz jus a seu parceiro e entrega um retrato sensível de uma jovem contestadora que luta para conquistar uma posição que a satisfaça dentro de seu novo ambiente e desafia as regras pré-definidas deste, mesmo sabendo das desavenças que suas atitudes devem causar.

No primeiro filme em que também atuou como diretor de fotografia, Paul Thomas Anderson se inspira fortemente em dramas românticos dos anos 40 e realiza uma produção sofisticada e surpreendente, não apenas em sua trama, mas na forma adotada pelo diretor, que, apesar de se distanciar do visual de seus filmes anteriores, se prova extremamente apropriada por sua característica ultra detalhista, que reflete o protagonista, além de ilustrar imageticamente algumas relações de poder expostas na trama.

Outros pontos fundamentais no filme são os impecáveis figurinos – essenciais em um filme sobre um estilista – o design de som, que potencializa ruídos para que entendamos o incômodo que eles causam em Reynolds, e a brilhante trilha de Jonny Greenwood, que ilustra musicalmente o interior dos personagens e o estado momentâneo de determinadas relações.

O filme foi indicado a seis categorias no Oscar: Melhor Filme, Direção, Ator (Day Lewis), Atriz Coadjuvante (Lesley Manville), Trilha Sonora e Figurino, e venceu a última.

Foi o último filme de Paul Thomas Anderson até Licorice Pizza, que chegou aos cinemas brasileiros no dia 17/02, foi aclamado pela crítica estrangeira e conquistou três indicações ao Oscar, nas categorias de Melhor Filme, Direção e Roteiro Original.

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