O monstruoso racismo em Lovecraft Country – Primeiras impressões do novo sucesso da HBO (2020, de Misha Green)


Estreou no último domingo a nova série da HBO, a superprodução Lovecraft Country. Baseada nas obras literárias de terror cósmico de H. P. Lovecraft, e adicionando críticas sociais e raciais, o 1° capítulo alcançou grande audiência e uma gigantesca campanha de marketing. Temos aqui 3 grandes cabeças no comando da produção: Misha Green (Underground), Jordan Peele (Corra!Nós) e J. J. Abrams (Star Wars, Star Trek, Lost). Confira agora o que alguns dos membros do site acharam do ponto de partida da obra. Lembrando que essas são as primeiras impressões do início da série, uma matéria abordando toda ela deverá vir após a conclusão da mesma.

Léo Costa:

Lovecraft Country acerta ao trazer um malabarismo entre o escapismo do terror e do gore, com uma forte crítica racial de uma América doentia e cheia de supremacistas brancos e segregação. Se por um lado temos mortes chocantes, grandes efeitos especiais, um clima de aventura frenético e referências às obras do autor original, por outro somos imersos no verdadeiro horror da vida real: o sufocante racismo, os monstros brancos de carne e osso que menosprezam e atacam as vidas negras. 

A trilha sonora é excelente, figurino e direção de arte recriam a época, o drama funciona muito bem, pois já nos importamos com os personagens de início e as atuações estão espetaculares, um verdadeiro exemplo de como dar visibilidade para grandes artistas negros. E não se trata apenas de racismo, a personagem de Jurnee Smollett assume as rédeas na ação, em momentos girl power, ela é a mais eletrizante em cena. Afinal, racismo e machismo andam juntos, assim como outros tipos de preconceitos, e a série já chega quebrando com tudo isso. Os monstros em CGI impressionam, mas o verdadeiro mal a ser combatido é o racismo e seus cruéis praticantes. 


Rodrigo Zanateli:

Lovecraft Country começa com uma cena interessantíssima que anima qualquer fã do gênero a dar um voto de confiança à série. 

Série essa que se faz necessária num momento de contestação das obras do autor H.P Lovecraft, e que busca reinventar seus mitos com uma roupagem antirracista e anti supremacia branca. Para que seus louros como autor não sejam esquecidos “somente” por ele ser um racista na sua vida pessoal (e em alguns trechos de sua obra). Algo muito semelhante com o que acontece no Brasil com Monteiro Lobato, diga-se de passagem. 

E como esse contexto todo se aplica no primeiro episódio da série e nas minhas impressões? Explico. A série é encabeçada por três nomes, Misha Green, diretora e roteirista desse primeiro episódio, Jordan Peele, que faz um ótimo trabalho em suas produções ao desconstruir os estereótipos do homem negro em Hollywood e J.J Abrams, certamente a pessoa que está mais preocupada com o legado de Lovecraft dos três. Então, nessa junção clara de mentalidades divergentes, podemos ver a personalidade dos realizadores se aflorando nesse primeiro episódio.  O ritmo aventuresco do episódio piloto é um de seus grandes méritos e o ponto positivo para J.J., o outro é colocar personagens negros de uma maneira natural em  histórias que até hoje só vimos brancos serem protagonistas, ponto para Jordan Peele. Por mais sutil que seja as mudanças nos comportamentos dos personagens, é necessário para que normalizemos cada vez mais situações como essa e não termos somente um cineasta como o símbolo “do cara que faz isso”. Misha Green, a menos conhecida deles fez um ótimo trabalho ao juntar os aspectos dos outros dois produtores e ainda trazer uma força feminina ao episódio.

Mas, infelizmente, algumas coisas me deixaram com uma pulga atrás da orelha nesse piloto. O que me impede de ter curtido como alguns outros colegas. Antes de discutir o incômodo racial, quero dizer que a priori, eles não atingiram um estranhamento à la Watchmen (2019) que a produção buscou aqui. Agora, quanto a questão racial, dois pontos me deixaram olhando desconfiado: o primeiro é que os negros da mesma família não se parecem. Eles só são negros e isso parece ser o suficiente pra acreditarmos que são da mesma família. Uma crítica que acontece desde 1990 em Um Maluco no Pedaço. E, o segundo é a questão do White Savior, que me soa bem presente nesse episódio, principalmente na perseguição de carro. 

Como são só primeiras impressões, talvez elas estejam completamente erradas, mas isso é o que eu senti deste primeiro episódio.
Antonio Gustavo:

Em poucas palavras, o primeiro episódio de Lovecraft Country, segue aquilo que já esperávamos, ao mesmo tempo que funciona como ensaio e adaptação das obras do autor, o piloto também vem trazendo questionamentos sobre as pautas racistas que cercam os romances e a vida de Lovecraft, bem como a sociedade da época e a atual. É sim um começo promissor, representativo e apresentando uma narrativa instigante com várias pontas soltas e mistérios a serem resolvidos, a série empolga com o que pode vir a seguir.

Agora, tão forte quanto a narrativa é a estética de Lovecraft Country, com todo um estilo próprio na arte, na montagem e no tom, lembrando vagamente Corra! e Nós, também de Jordan Peele. Se espelhando nesses, a série traz ainda uma nova camada ao horror lovecraftiano, adicionando-o um profundo temor racial e mostrando que para nós (pessoas pretas), um branco de farda é muito mais assustador do que qualquer monstro gigante e que, nas histórias que costumamos ver, heróis espaciais podem ter sido defensores da escravidão.

  


Título Original: Lovecraft Country


Direção: Misha Green, Jordan Peele, J. J. Abrams


Episódios: 10


Duração: 60 min aprox.


Elenco: Jonathan Majors, Jurnee Smollett, Abbey Lee Kershaw, Courtney B. Vance e Michael K. Williams.

Sinopse: Chicago, 1954. Atticus Turner (Jonathan Majors) é um veterano do exército que vê sua vida mudar quando seu pai desaparece misteriosamente. Decidido a encontrá-lo, o jovem embarca numa viagem de carro ao lado do tio George (Courtney B. Vance) e da amiga de infância Letitia (Jurnee Smollett), mas a jornada logo se revela muito mais perigosa do que eles esperavam.

Trailer:




Episódio na íntegra no canal oficial da HBO:


E você, já assistiu ao 1° episódio? Está esperando o quê?

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