Falar de O Filme do
Bruno Aleixo é um desafio. Primeiro porque é um filme baseado em uma série,
e segundo porque é comédia nonsense e
as mensagens ocultas pelas obras do sub-gênero (se é que existem) exigem algum
exercício para serem descobertas.
Bruno Aleixo. Os episódios da série se dividem em esquetes sobre opiniões públicas,
verificações de boatos e comerciais. Mas a peculiaridade da série vai além: os
personagens são diferentes em como falam e roubam a cena nos momentos em que
aparecem. Bruno Aleixo é ranzinza e destrata quem está por perto. Há o Renato,
um monstro da lagoa que é estudante de engenharia e fala de forma arrastada. Os
dois são amigos de Homem do Bussaco, que tem problemas de pronúncia devido ao
seu português pré-histórico. A eles junta-se Busto, uma estátua de Napoleão
Bonaparte, e Doutor Ribeiro faz participações especiais, um médico que sofre de
invisibilidade desde os 34 anos.
O Talk Show
caminha sobre o Vale da Estranheza. Os
personagens recorrentes e secundários são baseados em figuras, objetos ou em
animais e são antropomorfizados. Todos se permanecem imóveis e apenas suas
feições faciais são animadas. Ilustrações e fotografias estáticas funcionam
como stabilishing shots e cenário. É
na visualidade e no diálogo que surgem as piadas, e daí a linguagem da série,
de como se comunica com seu público.
Aleixo mantém essa linguagem, mas o talk
show é deixado de lado para dar lugar a uma história: Bruno Aleixo é
chamado por uma produtora para escrever o roteiro de sua autobiografia, então o personagem
título se reúne com seus amigos para fazerem um brainstorm de ideias para o possível filme. Aí está o porém: o
roteiro se perde numa falta de foco em todas as histórias contadas pelos
personagens.
Justamente por causa disso, o filme (ou os filmes dentro do filme?) é um achado: o filme usa várias formas
de provocar humor. Além das piadas faladas, o riso também é conseguido por
choques de linearidade. O caso de Bussaco, por exemplo, que sugere que a biografia
de Aleixo seja um filme de ação como Miami
Vice, e o filme se transforma numa estética nostálgica dos filmes de ação do gênero. Há também a ideia de Renato: um noir sobre quando
ele e Bruno investigavam um assassinato, e o filme fica em preto e branco e
passa em um hotel misterioso – mas nem Renato sabe porque é misterioso e o que
faziam ali, nem Bruno se lembra.
mudada a todo momento de acordo com os gêneros narrados pelos personagens. A
autobiografia vira um filme de terror e os efeitos são gráficos. Há uma
história sobre patriarcado e o filme vira uma novela brasileira. Também há
momentos sobre uma indecisão se é para rir ou apenas ver. Uma das narrativas relembra
uma cena em que Bruno e Busto foram para uma festa. Bruno deu “oi” para todos da
porta. Já Busto saiu cumprimentando todas as pessoas da festa. Esse é o
flashback. Busto cumprimenta as pessoas. É apenas isso.
Então sobre o quê O Filme do Bruno Aleixo fala? Talvez de comunicação, procrastinação,
ou de uma série de problemas que não se resolvem. O que importa é que é uma
experiência perceptiva inteligente.
rapaz semi invisível aproveita seu momento na praia. Numa alusão à Um Conto de Verão, de Éric Rohmer,
o jovem brinca com a areia, nada, se apoia no muro, admira a praia. Apenas seu
calção e seus chinelos são evidentes, já seu corpo parece desaparecer. Nada
explicado. Corta para Bruno conversando com Ribeiro no telefone. Essa é a ideia
de Ribeiro, friamente descartada por Bruno. As histórias que contamos formam a
nossa personalidade. Os filmes que vemos também.
*Visto durante o 43º Festival Internacional de Longas-Metragens de São Paulo*

Título Original: O Filme do Bruno Aleixo
Direção: João Moreira e Pedro Santo
Duração: 92 mins.
Elenco: João Lagarto, Rogerio Samora, Adriano Luz, Gonçalo Waddington
Sinopse: Bruno Aleixo é chamado por uma produtora para escrever o roteiro de sua cinebiografia. Mesmo sendo o que tem as melhores ideias, ele chama seus amigos para decidirem o que escrever no roteiro.