Hereditário foi exibido no Festival de Sundance no começo do ano e, desde então, tem gerado muitos burburinhos por ter tido uma aprovação gigantesca dos críticos, que pintaram o filme como O Exorcista dos dias atuais. Com altas expectativas, notas baixas do público estadunidense e polêmicas em torno das reações populares, seria fácil de haver uma decepção grande com o filme, mas felizmente, Hereditário vai muito além de um terror com qualidades técnicas; ele é genuíno por fazer de maneira quase que única o que todo filme desse gênero se propõe a fazer: amedrontar.
Após o falecimento de sua mãe, Annie Graham (Toni Collette) lida com o luto e com as rachaduras da sua família da maneira que pode. Com os segredos de sua mãe sendo descobertos, acontecimentos estranhos começam aparecer na família Graham, colocando em cheque a sanidade de Annie.
Falar de Hereditário sem dar spoilers é muito difícil, pois a história têm várias reviravoltas e o trailer não revela muito sobre o que realmente está acontecendo, mas eu não darei spoilers nesse texto, já que acima da história em si, Hereditário reúne vários elementos técnicos que criam um clímax assustador.
O filme é quase que dividido em duas partes; na primeira, há um foco maior no drama familiar e na perda de Annie, que mesmo sem demonstrar muito, sente o luto. Depois de um acontecimento muito forte, o filme passa de um drama familiar, para um terror agonizante, onde há reviravoltas e toda imagem que foi criada da protagonista vai sendo desconstruída. Uma ótima sacada, pois dá tempo de você criar um vínculo com a família e quando as coisas começam a piorar, você se importa com os personagens.
A direção do estreante Ari Aster se prova mais madura e ousada que de muitos veteranos por aí. Aster movimenta a câmera de várias maneiras em ambientes diferentes. Os planos mais abertos feitos em cômodos específicos brincando com a profissão de Annie podem ser estranhos no começo, mas fazem todo o sentido com o passar o filme. Os planos mais fechados que ele faz nos personagens são agonizantes, e acompanham cada expressão precisa do elenco, principalmente de Toni Collette.
A ambientação da casa é bem feita, sempre nos momentos internos da residência dos Graham, os tons são frios e há pouca luz; já nos ambientes externos, as cores são menos sóbrias e mais quentes (exceto no Grupo de Apoio). A trilha sonora também é muito bem utilizada, criando tensão nos momentos certos, variando o volume de acordo com o que está prestes a acontecer, sendo que o silêncio também é muito bem explorado.
Toni Collette é um monstro em cena, suas expressões faciais são fora do comum, ela oscila de humor em uma mesma cena várias vezes, é surreal. Tem uma cena ótima em um jantar, que ela exagera (com consciência) e você pensa que ali é o ápice do seu trabalho, mas nas cenas seguintes, ela consegue sempre se superar. Não é uma performance somente de reações, comuns em filmes desse gênero, Toni constrói uma protagonista complexa e que cautelosamente, confunde o telespectador. Ela entregou uma das melhores performances dessa década e todo o reconhecimento que ela receber, será pouco. Alex Wolff oscila, tem cena que ele está muito bem, tem cena que falta carga dramática e expressões mais fortes. Em um confronto com a Toni, ele some, mas há umas três ou quatro cenas que ele se sai muito bem. O papel dele também é bem difícil, então dá para relevar.. Ann Dowd rouba a cena, mas seu espaço em tela é curto.
Hereditário amedronta, apavora e assusta sem recorrer aos jumpscare fáceis e mal pensados, é um filme tecnicamente impecável, com um roteiro bem elaborado e uma performance única de Toni Collette.
Título Original: Hereditary
Direção: Ari Aster.
Elenco: Toni Collette, Alex Wolff, Ann Dowd, Gabriel Byrne e Milly Shapiro.
Sinopse: Após a morte da reclusa avó, a família Graham começa a descobrir alguns fatos misteriosos sobre a família que afetam principalmente a filha Annie (Toni Collette) e a neta Charlie (Milly Shapiro). Com segredos familiares prestes a serem revelados, eventos misteriosos começam a acontecer na casa dos Graham.