Crítica: Kong: Ilha da Caveira (2017, de Jordan Vogt-Roberts)

Primeiro, um pouco de contextualização. Na Era de Ouro de Hollywood, mais especificamente nos seus primórdios dos anos de 1920 (que se estendeu até os anos 60), eram comuns as matinês de cinema, projeções de filmes durante as manhãs. Começou na França e ganhou o mundo, eram exibições de filmes família, geralmente comédias pastelonas e aventuras na selva, com aqueles galãs clássicos salvando lindas mocinhas dos índios, leões e outros obstáculos. Até que em 1933, um filme chegou quebrando alguns paradigmas. O filme adaptava o conto de A Bela e a Fera para este cenário da selva, com uma leve crítica ecológica (não mexa com a natureza) e uma crítica ao próprio entretenimento (sim, já nos anos 30 começavam as críticas ao próprio excesso do cinema e do teatro). Estamos falando do primeiro King Kong, onde os humanos encontram uma ilha repleta de criaturas gigantes e dinossauros. Lá, o gorila gigante se apaixona pela mocinha humana, porém homens inescrupulosos o capturam e o levam à civilização, culminando no trágico e criticado final. 

Nos anos 70 tivemos uma versão com uma jovem Jessica Lange (Feud), uma produção um tanto conturbada e cínica, mas eficiente. A mesma gerou uma desconhecida sequência em 1986, com um roteiro bem improvável. Em 2005, tivemos um remake fiel ao longa de 1933, porém cheio de pompa e impacto, onde se explicitou ainda mais como a Bela acaba matando a Fera. Dirigido pelo excelente Peter Jackson (diretor das trilogias de O Senhor dos Anéis e O Hobbit), o longa é um espetáculo de 3 horas de duração, mostrando em detalhes a selvagem Ilha da Caveira. Passaram-se os anos e o público só quer saber de super-heróis. A prova disso é a recepção um tanto cínica que o público, especialmente o brasileiro, tem tido para com os filmes de monstros gigantes. Enquanto que o mundo afora elogiou e abraçou a retomada com Círculo de Fogo (2013), o remake de Godzilla (2014) e Jurassic Wold (2015), aqui os mesmo foram mais detonados. Este próprio novo filme parece estar sendo um tanto rejeitado por aqui, apesar das bilheterias gigantes. O que soa irônico, uma vez que o próprio Kong: Ilha da Caveira vem para mudar algumas características dentro do estilo e fazer aquilo que os filmes de heróis mais fazem: começar sua saga de universo interligado. E quem poderia se interligar com um gorila gigante? Que tal um “lagarto” gigante, mais precisamente o Godzilla de 2014?



Kong começa com um grupo de pesquisadores, uma fotógrafa, um mercenário e vários soldados da Guerra do Vietnã chegando com tudo a tal ilha, até se depararem com o seu Rei, que logo os põe no seu devido lugar, numa devastadora cena de impacto inicial. Logo após isso, o clima de selvageria, entretenimento pipoca e referências toma conta. Primeiramente já deve-se dizer: é um filme “ame ou odeie”. Se você gosta deste estilo de filme com animais gigantes, puxa vida, irá amar. Mas se não é “sua praia”, fique longe. 

O roteiro é uma faca de dois gumes, cheio de erros e acertos. É no roteiro o maior problema do filme, que além de clichê e previsível (você já imagina alguns acontecimentos e já os viu em outras obras), desenvolve muito mal os dois protagonistas da trama. Tom Hiddleston é um mercenário e guia do bem, Brie Larson é uma bela fotógrafa; e é isso, somente isso. Ambos não tem grandes influências na trama e sinceramente não precisavam estar no longa. Para se ter uma ideia, todos os demais coadjuvantes têm funções melhores que as deles. Porém, Hiddleston ao menos empresta um charme inglês típico dos heróis clássicos deste estilo de filme, o que se perdoa. Já Larson, ganhadora do Oscar de Melhor Atriz por O Quarto de Jack, está bem limitada. Ela é uma boa atriz, mas o roteiro não dá uma ação importante a ela no longa. E além destes detalhes, há alguns excessos nas sequências de aventura e breves furos, como passagens muito rápidas do dia e da noite.

Mas por outro lado, o roteiro acerta na construção dos coadjuvantes, o que acarreta atuações decentes. John Goodman faz pouco, mas bem e é impressionante como o ator está melhorando com o tempo, entregando papéis de respeito (vide Rua Cloverfield, 10). O ator Toby Kebbel, que é fraco e limitadíssimo, entrega algo razoável no pouco que aparece, mas o “plus” está no fato dele emprestar suas expressões faciais na captura de movimentos, para criarem um Kong mais “humano”. Samuel L. Jackson entrega o de sempre: um bom coadjuvante. Aqui ele é o vilão, um tenente completamente surtado, com uma mente “alucinada” devido aos traumas dos horrores do Vietnã. E John C. Reilly é o melhor personagem da trama, extremamente carismático e engraçado. Outro ator que conforme fica mais velho, entrega personagens divertidos e memoráveis; é o grande fator humano do filme. 

O roteiro também é lotado de referências, seja ao filme de 1933, seja aos elementos apresentados no remake de 2005. Mas há muito mais além disso. O clima do filme é totalmente construído em cima de clássicos de Guerra do Vietnã, principalmente o imbatível Apocalipse Now. O clima quente e tropical, toda a trilha sonora dos anos 70 (com excelentes canções), os próprios cartazes de divulgação, tudo remete a este e outros filmes de guerra. Há uma sutil cutucada na própria guerra, que foi totalmente sem sentido e uma causa “abandonada”. Além disso, temos easter eggs e elementos interligados ao Godzilla de 2014, como a presença de monstros, espécies de lagartos místicos, que na verdade são Kaijus: monstros comuns da cultura japonesa.


As sequências de ação são impossíveis, concordo, mas tomam assumidamente um tom cartunesco, galhofa, divertido, desmiolado, com criaturas por toda parte. Há algumas cenas que podem assustar, temos partes e gosmas de bichos jorrando e é legal ver a coragem de colocarem uma certa quantidade de gore. Mas nunca é chocante a ponto de espantar a plateia, ainda é um filme família, matinê, porém moderno, com ritmo insano e cheio de sacadinhas. Ele assume uma postura classe B, nunca se leva a sério e lembra as produções da Toho, indústria japonesa criadora do Godzilla e que proporcionou diversas obras trash de gosto duvidoso (algo parecido com Power Rangers), mas irresistivelmente divertidas e que encontrou seu público. Porém, aqui neste Kong, esta palhaçada é feita com efeitos especiais de última geração, entregando um gorila que finalmente não é “vítima da mocinha”, mas manda na “parada toda”, arrebenta cabeças e é o Rei que se espera em uma ilha exótica. Suas expressões são ótimas, a textura do pelo e a umidade e reflexo dos olhos impressionam, parece realmente que está vivo, grande trunfo da equipe visual. 

O ritmo é uma montanha-russa, a fotografia é quente, há feixes de luz que refletem contra a câmera e dão uma sensação calorosa e tropical. O diretor Jordan Vogt-Roberts tem um ótimo domínio de câmera, centralizando personagens, dando plano-sequências eletrizantes, sabendo onde se posicionar na hora da ação e manipula bem tudo em cena. É tudo de encher os olhos. Em momentos parece que estamos folheando uma HQ colorida, porém com um herói que não usa capa ou armadura, mas que apenas quer manter o equilíbrio natural do seu lar. Mas o tom heroico se mantém ali, seja na trilha sonora grandiosa ou nos golpes insanos. Se me incomodou o fato de um macaco fazer isso? Não, e na verdade curti muito mais um carismático animal botar “ordem na casa” do que apenas mais uns humanos fazerem a mesma “farofada”. Se Kong é exagerado? Sim, é. E talvez seja um prazer culposo, um filme de história boba e burra. Mas quando você quer ver um gorila gigante destruindo monstros, quem se importa? Kong entrega isso, e em dobro do que você imagina. Kong: Ilha da Caveira é grande, barulhento e destruidor, assim como o seu herói. E sinceramente, estava esperando por isso. 

Fique para a cena pós-créditos. E que venha King Kong vs Godzilla em 2020. Antes disso, teremos Godzilla 2 em 2018. 



O colossal Godzilla. Já imaginou o encontro destes dois heróis?

Nos anos 60, o estúdio japonês Toho já fez o encontro destas duas lendas da cultura pop, com fantasias e efeitos no melhor estilo Power Rangers

Título Original: Kong: Skull Island

Direção: Jordan Vogt-Roberts

Elenco: Tom Hiddleston, Brie Larson, Samuel L. Jackson, John Goodman, John C. Reilly, Jing Tian, Toby Kebbel, Corey Hawkins, Jason Mitchell, Thomas Mann, Shea Whigham, John Ortiz, Terry Notary.

Sinopse: o filme recria a origem do mítico Kong numa aventura original emocionante dirigida por Jordan Vogt-Roberts. No filme, um eclético time de exploradores se aventura nas profundezas de uma desconhecida ilha do Pacífico, a Ilha da Caveira – tão bela quanto traiçoeira – sem saber que estão invadindo os domínios dos reis dos símios, o mítico Kong.


Trailer: 





Cartazes e fotos do filme:

  

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1 thoughts on “Crítica: Kong: Ilha da Caveira (2017, de Jordan Vogt-Roberts)”

  1. Who is Godzilla's most powerful enemy?
    Godzilla's arch rival is King Ghidorah always challenging him for the crown of King of the monsters. …Godzilla vs Kong
    King Ghidorah is the strongest of all his enemies who actually lifted him up multiple times and dropped him from many miles up in the air.

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