‘A Fita Branca’ procura as raízes do ódio









Michael Haneke sempre foi um
cineasta questionador e transgressor. Seus filmes costumam abordar temas
complexos de maneira ousada, o que muitas vezes afugenta espectadores que não
estão dispostos a observar e pensar durante todo o tempo de projeção de seus
filmes. Mas esse é justamente o charme de suas obras, quase todas elas da maior
grandeza e importância. 




 


Depois de refilmar, sem nenhuma novidade, em solo americano, seu filme da década
de 1990 ‘Funny Games’, Haneke voltou a elevar sua arte na potência máxima com ‘A
Fita Branca’, um estudo minucioso sobre um tema que ainda é tabu: a dominação
de gerações mais velhas sobre as mais novas, em especial dos pais com os
filhos, e os traumas e distúrbios que isso pode gerar. 






O cenário é um pequeno povoado em uma
Alemanha prestes a vivenciar a guerra. A câmera de Haneke filma, através de uma
fotografia em preto e branco, que sublinha a frieza desejada, a vida dos
moradores sendo transformada pelo medo após uma série de acontecimentos
estranhos: um arame quase invisível é colocado entre duas árvores, fazendo com
que o médico do local sofra um grave acidente, enquanto duas crianças são
brutalmente agredidas. Em meio ao pavor e a estranheza, a narrativa desconstrói
as vidas perfeitas que ali habitam. O médico respeitável tem um caso com a
empregada e assedia a própria filha, enquanto outro morador exige rígida
disciplina dos filhos, sendo capaz de mandá-los dormirem sem jantar, ou de
amarrar o próprio filho na cama para que ele não se masturbe. Tudo sob os olhos
atentos do professor da escola local. 








A proposta do diretor ao analisar a
ideia da punição resulta em um filme com fluidez, que mantém o distanciamento
necessário como forma de lembrar o quanto aquele ambiente é rígido e o quanto
falta calor humano em muitas daquelas casas e famílias. E nesse aspecto, ‘A
Fita Branca’, mesmo se passando no início do século XX, se mantém atual ao
mostrar uma sociedade baseada em ideais hierárquicos, seja de idade ou de classe
social, e em procurar as raízes do ódio no ser humano. A analogia é clara e
pertinente: anos depois do ódio nesse vilarejo, explodiria o ódio responsável
pela morte de milhares de judeus em um dos momentos mais sombrios da história da
humanidade: o holocausto. Pode parecer presunçoso tentar entender e buscar a
origem disso, mas Haneke pode ser presunçoso, pois talento para isso possui. 







Nota: 9


Direção: Michael Haneke


Elenco:  Christian Friedel, Ernst Jacobi, Ulrich Tukur


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