Crítica: Parasita (2019, de Bong Joon-ho)

“A desigualdade é a raiz do males sociais”
– Papa Francisco

O diretor Bong Jon-ho ficou conhecido pelos seus longas repletos de críticas ao capitalismo desenfreado e reflexões sobre questões de classe como os aclamados Okja e Expresso do AmanhãO coreano se esforça para que suas obras sejam um reflexo da realidade e do contexto sócio-politico atual, e assim estimulem questionamentos sobre os problemas sociais contemporâneos e demonstrem como a desigualdade social constitui um sistema extremamente injusto.


Parasita segue a mesma linha de reflexão contando a história de um jovem coreano que se encontra em situação de vulnerabilidade social e através de um elaborado esquema consegue garantir um emprego para todos os seus familiares na mansão de uma família rica. O filme constrói arquitetadamente um retrato social dicotômico entre uma Coréia do Sul abastada e privilegiada e uma outra desfavorecida e humilde sem se perder em clichês e fórmulas, criando assim uma obra extremamente original e instigante.


Embora suas atitudes antiéticas se intensifiquem durante o filme, a família Kim inicia a trama como uma família de classe popular comum fazendo o possível para sobreviver, chegando ao ponto de deixar a janela aberta durante a dedetização da rua para conseguirem dedetizar a própria casa de graça. Essa cena exemplifica o quão angustiante é a situação financeira da família. Eles literalmente só possuem a intenção de manter seus empregos e garantir uma renda para se manterem de maneira digna.


O roteiro desenvolve aos poucos as características de seus protagonistas engajando o público a se colocar no lugar dos mesmos e compreender suas motivações. O primeiro plano do filme em que vemos através da janela do apartamento dos Kim serve como metáfora ao colocar o telespectador literalmente na posição dos personagens enxergando o mundo do lado de fora a partir do mesmo ponto de vista deles. Somos convidados a nos infiltrar no cotidiano daquelas pessoas e sentir o mesmo desespero que eles. A cena do apartamento-porão alagado e pai e filhos fazendo o possível para conseguir salvar o pouco que possuem força o telespectador a se questionar se não faria o mesmo vivendo aquela situação.



É interessante notar como as duas famílias retratadas no filme, por mais proximidade que tenham, estão sempre extremamente distanciadas devido as suas realidades sociais. Até mesmo na forma de tratamento de cada um dos membros da família Kim é possível notar uma diferença. Kevin e Jessica por serem tutores dos filhos dos Park são sempre tratados com um nível de respeito e cordialidade maior já que seus cargos possuem um tom mais elitista, enquanto que seus pais que estão em funções mais serviçais são tratados de uma maneira mais distanciada. 


O Sr. e a Sra. Park representam bem como funciona a dualidade entre patrão e empregado, pois por mais gentis que eles sejam com seus funcionários, há sempre a lembrança que a relação que existe ali não é amistosa, mas sim veementemente empregatícia. O mal cheiro que o patrão diz sentir quanto está perto de seu motorista é o exemplo perfeito do classismo sutil que é apresentado pelo filme, deixando claro que o casal Park não enxerga seus empregados como iguais. É interessante ver como a narrativa vai elaborando a tensão entre classes sutilmente até sucumbir ao ápice dramático do filme.

Parasita possui uma linguagem muito particular que envolve aos poucos o telespectador em sua trama e constrói personagens cheias de nuance e complexidade. O enredo apresenta seus protagonistas como pessoas que podem ser considerados amorais, falsificando credenciais e fingindo experiência para manipular a família Park a contratá-los. Mas não existe por parte da narrativa qualquer intenção de fazer julgamentos sobre a moralidade de seus “heróis”, muito pelo contrário, Jon-ho utiliza sua orquestrada trama e suas personagens como uma alegoria que exemplifica a que níveis a segregação social chegou devido ao distanciamento de classes, obrigando aquelas pessoas a cometerem atos inimagináveis.


A trama poderia ser apenas mais uma comédia ácida recheada de comentário social, mas o filme se distingue de outras obras do gênero ao trazer elementos completamente inesperados ao seu enredo. A reviravolta no meio recria o tom do filme o deixando bem mais sombrio que o esperado, mas ao mesmo tempo sem descaracterizar tudo que o diretor havia construído até ali. Isso evidencia as habilidades narrativas de Jon-ho que conduz sua trama habilidosamente.

Bong Jon-ho tece o tom de sua obra com inteligência intercalando os momentos cômicos com os mais dramáticos sem criar qualquer estranhamento ao telespectador, criando uma fluidez narrativa. O filme se transporta de um momento cômico a outro desesperador sem desfazer sua tão bem construída atmosfera. Parasita já se estabelece como um clássico contemporâneo que ainda será muito revisitado pelos amantes de cinema. 
Título Original: Parasite 기생충

Direção: Bong Joon-ho

Duração: 132 minutos


Elenco: Song Kang-ho, Jang Hye-jin, Choi Woo-shik, Park So-dam, Lee Sun-kyun e Cho Yeo-jeong
    Sinopse: Um jovem vê a oportunidade de garantir emprego para todos os membros de sua família na mansão de uma família rica, mas a casa não é o que parece.

    Trailer:

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