Crítica: O Caravaggio Roubado (2019, de Roberto Andò)


Uma ficção que brinca com a realidade. Assim é retratada a história dirigida por Roberto Andò, que explana como ponto central, sobre um dos 10 maiores roubos artísticos da história que aconteceu há 50 anos e permanece sem solução, o Natività de Michelangelo Caravaggio. 

A engrenagem do filme é funcional e cada peça tem um encaixe quase perfeito: o roubo de um quadro de valor inestimável, a máfia italiana, o cinema, a política, as relações humanas com toda a sua amoralidade inerente… um suspense contado de uma forma extremamente dinâmica e carregado de humor com uma dose amarga de realidade. 
O Caravaggio Roubado tem início com uma produtora de cinema recebendo Alessandro Pes, um roteirista “boa vida” e um tanto vigarista que diz ter um trabalho que impressionará a todos e, mais do que depressa, pede um adiantamento ao produtor. Ele não escreve nada novo há muito tempo, mas conta com Valeria que é a secretária deste mesmo produtor e a excelente roteirista fantasma por trás de toda sua fama e reconhecimento. 

Valeria é uma mulher séria, tímida, sem amigos, que mora com a mãe e parece viver somente para seu trabalho. Ela nutre um amor por Alessandro e por isso, de uma forma ou de outra, acaba sempre cedendo a seu charme e se dedicando de corpo e alma a seus pedidos, por mais complicados e tortos que possam parecer. 
Na intenção de começar a se dedicar à criação desse novo roteiro prometido a Alessandro, Valeria vive um inesperado movimento: um estranho com uma abordagem completamente invasiva, diz ter uma história do seu interesse para contar, ela deveria procurá-lo e manter-se em completo silêncio, porque esse misterioso homem dizia temer por sua segurança e, por essa razão, não queria que ninguém viesse a descobrir qualquer envolvimento dela com o assunto. 

Valéria é levada pela curiosidade e mergulha de cabeça nessa proposta sem qualquer prudência e, não muito mais tarde, descobre todo o perigo em que se envolveu.


No decorrer dos acontecimentos, Valeria parece ir mudando até mesmo sua personalidade em um curto espaço de tempo e, como um camaleão silencioso e observador, vai se infiltrando em lugares que a faz correr riscos e se aproximando das pessoas de caráter duvidoso em prol de suas descobertas, da ânsia por estar se sentindo viva e por ver a criatividade pulsando em si.
Nossa protagonista não é das mais apaixonantes, mas desenvolve muito bem o seu papel de moça séria e até mesmo na sua total imprudência e nos seus exageros, acabamos torcendo por ela. Aliás, acabamos criando empatia com a maioria dos personagens, cada um com suas características, seus atrativos, seus pontos dramáticos ou humorados sempre nos tocam de alguma maneira. De uma forma geral os papeis foram bem construídos e interpretados de uma forma convincente, até mesmo os mais caricatos cumprem uma finalidade.

Embora tenha sido caracterizado como um suspense, o roteiro é muito divertido (engraçadinho até demais, em alguns momentos), intrigante e curioso. E, cá pra nós, falar sobre tantos assuntos interessantíssimos, todos entrelaçados na mesma trama, é razão o suficiente pra nos deixar no mínimo curiosos e nos manter presos ao filme até seu final, e assim foi. Contudo, sinto que essa história possuía quantidade suficiente de ótimos assuntos para desenvolver e se perdeu um pouco ao querer tratar de outras tantas subtramas sem conseguir se aprofundar em nenhuma. 


O Caravaggio Roubado tem uma ótima trilha sonora toda instrumental, cheia de energia e emoção. Minha única questão aqui é a maneira com que ela foi usada, como se os acontecimentos não deixassem claro o suficiente o que querem passar e precisássemos de uma música como artifício para nos dizer o que sentir em cada momento de ação ou de drama. Uma ferramenta tão maravilhosa que acaba sendo desperdiçada ao subestimar seu espectador.
Podemos contar também com uma ambientação impecável, uma fotografia lindíssima que ganha ainda mais força pelas belas paisagens italianas. O fato de o filme ser um pouco mais escuro, como se estivesse com uma luz baixa, deu um ar de mistério aos acontecimentos e, além disso, a obra trabalha com uma paleta de cores extremamente sóbria, com uma predominância entre pretos, cinzas e marrons que sempre me remete ao charme dos filmes antigos.
O italiano tem uma outra forma de contar suas histórias, uma outra forma de atuar, um outro jeito de fazer cinema… eles são intensos, dramáticos, viscerais… o que faz uma diferença enorme para nós que temos o cinema americano como referência. Essa sensação constante da descoberta de um novo mundo me é maravilhosa!

Título Original: Una Storia Senza Nome
Direção: Roberto Andò
Duração: 110 minutos
Elenco: Micaela Ramazzotti, Alessandro Gassman, Laura Morante, Jerzy Skolimowski, Silvia Calderoni, Renato Carpentieri, Antonio Catania, Gaetano Bruno, Marco Foschi, Renato Scarpa, Michele Di Mauro
Sinópse: Alessandro é um roteirista bon vivant e picareta que promete uma história impressionante ao dono de uma produtora de cinema, mas não escreve nada há muito tempo, o mesmo período em que tem Valéria como a criativa roteirista fantasma que sustenta sua fama. Ela, a competente e séria secretária desta mesma produtora, que mora com a mãe e vive uma vida extremamente pacata, é abordada de forma inusitada por um homem que diz ter uma história que ela iria se interessar sobre o roubo do inestimável quadro Natività de Michelangelo Caravaggio e ela, levada pela curiosidade, mergulha de cabeça nessa perigosa e envolvente trama.
Trailer:


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