Crítica: Bumblebee (2018, de Travis Knight)



Transformers é um produto saído dos lendários anos 80. Inicialmente uma linha de brinquedos da Hasbro, uma gigante no segmento, acabou ganhando uma série animada elogiada na mesma época, quadrinhos, games e outros de lá para cá. A estreia no cinema se deu em 2007, com um filme cujo roteiro é criticado, mas que trouxe uma alta bilheteria e alguns elogios em cima das cenas de ação, efeitos especiais e sonoros (alguns até esquecem das diversas indicações técnicas que o mesmo recebeu no Oscar), além da emoção e descarga de adrenalina. Longe de ser uma obra-prima, o primeiro filme é divertido e um bom entretenimento quando avaliado separadamente, já que o excesso de continuações e os excessos de explosões, ação e CGI tiraram um pouco da rica mitologia deste universo. 


A cada novo filme (A Vingança dos Derrotados em 2009, O Lado Oculto da Lua em 2011, A Era da Extinção em 2014 e O Último Cavaleiro em 2017), tivemos mais maluquices e menos nexo. Excessos, a palavra que melhor define o “explosivo” Michael Bay (perdoem o trocadilho, entendedores entenderão). Tais excessos desgastaram a crítica especializada (que tem um certo “ranço” um tanto exagerado com o diretor), assim como o público, cujo quinto filme teve uma bilheteria morna. Portanto, a Paramount e a Hasbro decidiram inovar, trazendo um diretor pouco conhecido – mas competente – e um retorno às origens, na icônica década de 80. 





Feita a contextualização, vamos a Bumblebee, o filme em questão nesta matéria. 


Com orçamento menor, trama mais simples, direção mais enxuta, executou-se aqui a premissa de que “menos é mais”, e deu certo! De volta ao cenário da animação, vemos uma empolgante batalha em Cybertron, trazendo nosso Bee chegando a Terra, se camuflando de carro e conhecendo, assim, a jovem Charlie, garota que está passando por um momento de incertezas. 


É interessante notar já de início que o filme não se preocupa em explorar longas cenas de ação, explosões e efeitos em CGI, mas aprofunda-se no afetuoso relacionamento de amizade entre Bee e Charlie. Cheio de momentos leves e simples, o roteiro explora esta amizade sincera, além dos dois protagonistas interagirem com quem está ao seu redor: a mãe de Charlie, Memo (o amigo e interesse romântico da jovem), o carismático Otis (irmão caçula de Memo), até o divertido cachorrinho da jovem, no qual tem cenas de interação hilárias e bonitas com o Bee.







O trunfo do filme é ter uma ótima protagonista. Hailee Steinfeld é uma excelente jovem atriz, vinda de alguns filmes cults, onde destaca-se Bravura Indômita, faroeste dos irmãos Cohen. Lembra-se da vingativa menininha do filme, muito talentosa na atuação? Pois é… Hailee dá profundidade à sua personagem, Charlie, de maneira incrível, com momentos emocionais, outros empoderados, outros de garra e determinação. Sua interação com os demais personagens é cativante, especialmente com Bee, os quais entregam uma genuína amizade. E dar tal entrega quando se atua com o CGI, ou seja, atua com o nada, é um pouquinho complexo. E ela faz tudo isso. E note, estamos falando de um blockbuster de fantasia, especificamente de um Transformers, que inicialmente nem precisara de tanto esmero. Ela é ótima em algumas cenas que nem precisaria ou exigiria tanto disso.

Outra surpresa é o vilão humano do ator e lutador John Cena. Propositalmente caricato, um militar cheio de frases de efeito e momentos “machão”, o roteiro primeiro brinca com este clichê, para depois dar outros contornos ao personagem. Ele passa por momentos cômicos, que praticamente o tratam como um “brucutu”, distanciando-se daquele patriotismo do diretor Bay e trazendo um lado mais crítico ao exército e sua função. É como se o diretor estivesse dizendo: esqueça aquele herói fictício patriótico, o exército nem sempre é a salvação e está cheio de figuras burras que só sabem seguir ordens cegamente (ponto pro roteiro!). Mas depois ainda vão mais adiante e dão uma virada no plot do personagem, tornando-o mais humanizado.
A direção é de Travis Knight, que apesar de pouco conhecido, tem no currículo o belo e indicado ao Oscar Kubo e as Cordas Mágicas, ótima animação em stop motion da Laika, produtora especializada no gênero, dona das obras Coraline e ParaNorman. Travis sabe o que está fazendo, pois foge dos estilos tão criticados na direção de Michael Bay e faz seu próprio Transformers, mais humano, simples, limpo e bonito. A ação e o CGI continuam lá e são muito bons e com contornos épicos. A diferença é que antes tudo era ação e CGI, com fiapos de roteiros e personagens ao redor. Agora temos roteiro e personagens que criam conflitos, com motivações e histórias, daí a ação é consequência da criação dos conflitos e o CGI é um adereço à trama. Consegue notar a diferença? 






Travis Knight utiliza a câmera de maneira muito mais intimista. Há diversas cenas onde aproxima-se a lente dos rostos ou mãos dos personagens, para explorar seus sentimentos, e isso é um acerto, tornando assim uma obra mais pessoal e emocional. 
Os efeitos especiais são ótimos. A batalha inicial em Cybertron é de cair o queixo, assim como a ação. É grandiosa, mas conseguimos compreender o que acontece, pois os personagens estão bem posicionados na geografia e na dinâmica espacial da mise en scène. Há um take onde Charlie e Memo estão dentro do  Bee na forma de automóvel e o mesmo precisa se transformar em robô durante uma fuga. Tal cena possui um pequeno plano-sequência sob a ótica de dentro do carro, onde percebe-se a transformação do alienígena, a reação de apavoramento dos humanos, tudo bem dirigido e estiloso, com uma dinâmica divertida, todos esses elementos de uma vez só. 

Com a trama situada em 1987, a trilha sonora e as canções da década são um deleite para os saudosos que amam um flashback. Temos Duran Duran, Bon Jovi, The Cars, The Smiths, A-ha e muito mais. Tais canções dessas bandas não apenas embalam a nostalgia da trama, mas casam bem com as cenas em questão. Em uma era de filmes geeks e com easter-eggs, referências também não faltam a quem é escolado no universo da franquia. Bumblebee tem sua aparência clássica de um fusca amarelo, em vez do camaro, que traz assim uma fidelidade com a trama original e também certo afeiçoamento do público com este clássico modelo de automóvel (quem não amava um fusquinha na infância?). Optimus Prime também está na sua aparência clássica de caminhão, esta não tão diferente da versão moderna. Interessante também salientar que os Autobots e Decepticons possuem uma aparência que emula personagens de 8 bits de games e desenhos clássicos, assim como os efeitos do oitentista filme Tron

Apesar de possuir defeitos, como vilões alienígenas estereotipados, alguns clichês típicos lá pelo final, assim como uma trama simplista estilo Sessão da Tarde que pode espantar os mais exigentes, Bumblebee é diversão garantida. 


Deixando os excessos para trás e trazendo o potencial do universo dos Transformers, Bumblebee é enérgico, mágico, bonitinho, com bons personagens, uma protagonista humana forte, um carismático protagonista alienígena e uma ação mais limpa e engenhosa. Longe de ser revolucionário, é aquele clichê bem feitinho e que merece ser conferido sem preconceitos. Há bastante alma e bastante coração, que tornam o filme uma divertida experiência. 


Seguindo uma tendência moderna de obras como Super 8, IT e Stranger Things, Bumblebee resgata os dourados anos 80. E vai além, pois parece ter sido feito lá na época, a mãe da cultura POP como a conhecemos hoje. Com uma atmosfera que emula os longas de ficção da produtora Amblim e filmes do Steven Spielberg, como E.T., assim como dilemas e dinâmicas adolescentes que lembram os filmes de John Hughes (Clube dos Cinco), esta é mais uma obra cuja origem vem da inesgotável Era Oitentista, que até hoje continua gerando frutos e vertentes.






Título Original: Bumblebee

Direção: Travis Knight

Duração: 114 minutos

Elenco: Hailee Steinfeld, John Cena, Jorge Lendeborg Jr, Jason Drucker, John Ortiz, Dylan O’Brien,  Peter Cullen, Justin Theroux, Angela Bassett.

Sinopse: 1987. Refugiado num ferro-velho numa pequena cidade praiana da Califórnia, Bumblebee, um fusca amarelo aos pedaços, machucado e sem condição de uso, é encontrado e consertado pela jovem Charlie (Hailee Steinfeld), às vésperas de completar 18 anos. Só quando Bee ganha vida ela enfim nota que seu novo amigo é bem mais do que um simples automóvel.





Trailer:



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