Indicação #4: Cinema Paradiso (1988)

Qualquer dica de filme eu possa fazer, sempre começa com Cinema Paradiso. Devo encher o saco com esse filme, falo dele para todo ser feito de matéria orgânica que aparece ao meu lado, mas faço isso pois esse filme merece o todo o prestígio do mundo. Desde que me conheço por gente, eu juntava moedinhas para alugar filmes na locadora. Assistia absolutamente qualquer coisa que colocassem no vídeo cassete, amava desenhos (e ainda amo), morria de medo de filmes de terror e hoje, por ironia, é meu gênero preferido; via novela com meus pais, assisti todos os Senhor dos Anéis por conta da minha irmã e me apaixonei pela fantasia, assim como também assisti todos os filmes da Lindsay Lohan por conta dela. Aprendi que cinema não era só helicópteros explodindo quando assisti 2001: Uma odisseia no espaço pela primeira vez. O impacto foi tão grande que demorei um bom tempo para restabelecer minha sanidade depois dessa surreal obra do Kubrick. Depois dessas várias histórias, de vários gêneros e formatos, finalmente consegui entender o que todas elas representavam para minha história assistindo Cinema Paradiso, que pode ser, talvez, a mais bela homenagem que o cinema fez para ele próprio. 

Não é necessário ser um expert em cinema, muito longe disso, trata-se apenas da forma que nos relacionamos com mundos ficcionais que não são os nossos, da capacidade desses mundos em projetarem sentimentos e sensações que não vivemos fisicamente. Momentos de amor e ódio que nos fazem chorar por dias, reviravoltas que nos deixam à beira da loucura, quase que pulando do sofá e destruindo a televisão, encontros e beijos em uma sala escura com cheiro de pipoca, manteiga e tecido velho. Mais ainda, nos fazem acreditar em futuros perfeitos ou imperfeitos, levantando ou não nosso senso crítico para tudo aquilo que ocorre ao nosso redor. Tatuamos em nossos corpos frases, imagens, rostos e cenas que representam momentos icônicos de nossas vidas, proporcionados por uma peça de arte, para que outros vejam o quão aquilo é importante para nós, mesmo sabendo que aquele momento, aquele singular segundo que dividiu nossas vidas em “antes e depois”, nunca irá voltar. 

Cinema Paradiso deixa aquele gosto amargo e doloroso de nostalgia amarrado no céu da boca, diz com todas as letras que tudo aquilo que você perdeu, seja familiares, amigos, amores, lugares e momentos, nunca mais será revivido ou revisitado. Cinema Paradiso tem uma terrível verossimilhança com a realidade, de dizer para o pobre ser que está assistindo “a vida não é como nos filmes, a vida é muito mais difícil”, a vida não é feita de amores perdidos e encontrados e de finais felizes, quase sempre o contrário de tudo isso, de decisões difíceis a serem tomadas, mas que por mais que todas estas sejam horríveis, nós ainda precisaremos escolher alguma, mas nem por isso perdem o significado. Cada um desses elementos nos moldaram como indivíduos, muito mais do que um mero assunto a ser puxado com uma pessoa desconhecida. Fizeram de nós quem somos hoje, nas mesmas dores e amores. E é basicamente isso que torna Cinema Paradiso tão belo, tão triste e alegre. A vida não é como nos filmes, é horrorosamente mais difícil que qualquer história de ficção, mas não deixa de ser a nossa vida, as nossas escolhas e a nossa história, e algumas vezes esquecemos que ela é o ciclo que nos leva ao próprio início e ao próprio fim no mesmo caminho que tomamos. 

Por fim, é olhar para trás e tentar reviver esses momentos, sem a mesma exatidão ou intensidade, borrados pelo tempo, mas de forma a pensar que somos constituídos de tudo aquilo que fizemos, de todas as histórias que vimos e assistimos, caminhos que confluem e divergem para nunca mais se encontrarem. Na primeira vez que eu assisti chorei horrores, sem a menor vergonha, tão marcante que pensei mil vezes antes de assistir uma segunda vez, no receio de estragar o momento quase que antropológico causado por essa obra de arte. Mas a dor quase masoquista de Cinema Paradiso nos faz lembrar da doce contradição da nostalgia, que a saudade, além de perda, significa amor. No fim, somos apenas histórias que se interligam em outras histórias contadas em outras histórias, que chegam e partem numa regência que somos meramente reféns, exatamente como no fim de Cinema Paradiso, que nos leva ao ecstasy da vida de tempos passados e queridos que já partiram, ao som de uma trilha sonora mais do que genial de Ennio Morricone. Com o título de “o final mais belo que já vi em toda minha vida”, posso dizer que linha entre a realidade e a ficção nunca foi tão lindamente tênue.

Indicação: Igor Motta

Direção: Giuseppe Tornatore

Sinopse: Nos anos que antecederam a chegada da televisão (logo depois do final da Segunda Guerra Mundial), em uma pequena cidade da Sicília o garoto Toto (Salvatore Cascio) ficou hipnotizado pelo cinema local e procurou travar amizade com Alfredo (Philippe Noiret), o projecionista que se irritava com certa facilidade, mas parelamente tinha um enorme coração. Todos estes acontecimentos chegam em forma de lembrança, quando agora Toto (Jacques Perrin) cresceu e se tornou um cineasta de sucesso, que recorda-se da sua infância quando recebe a notícia de que Alfredo tinha falecido.

Trailer:

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