Crítica: Locke (2013, de Steven Knight)


É relativamente normal que, quando pensamos em um filme, nossa mente já coloque vários lugares, cenas, paisagens, que vão passando pela tela conforme a história se desenvolve. Então, quando nos deparamos com um filme que se passa inteiramente dentro no mesmo lugar, é de se esperar a estranheza. Como um filme consegue sustentar toda uma narrativa de mais de uma hora dentro de um mesmo local? Ainda mais quando este local é apenas um carro?


Pois bem, essa é a ideia principal de Locke, contando a história de Ivan (Tom Hardy), um engenheiro que sai de seu expediente e decide fazer uma repentina viagem até Londres. De início, não sabemos o porquê dessa viagem nem ao menos se existe algum problema com o personagem que o faria abandonar tudo para seguir um rumo até então desconhecido. A partir do momento em que Ivan senta em seu carro e o dirige para a pista, toda a história se passará ali, sem outros cenários ou sem outros atores presentes na cena, pelo menos não fisicamente. Todas as informações que obtemos ao longo do filme são passadas por conversas de telefone entre o Ivan e seus conhecidos, que vão desde seu chefe ao motivo de cortar o país em plena madrugada.

É um filme simples, em todos os quesitos, o que em nenhum momento deixa de ser um bom filme. A gravação de “Locke” durou apenas oito dias de tamanha a praticidade do projeto. Em roteiro, é um longa surpreendentemente dinâmico, que consegue levar quem assiste até o fim sem se arrastar pelos meios, mesmo com um estilo de narrativa sem grandes reviravoltas, que aposta inteiramente nas problemáticas das relações humanas. O que move a história são as ligações ao longo da viagem. Cada ligação feita ou recebida pelo protagonista significa a gradativa destruição da vida que um dia tivera, das certezas que antes de ligar o carro eram absolutas. Chega a dar certo desespero da impotência de Ivan mediante os acontecimentos narrados e as consequências de seus atos passados.

A fotografia do filme segue esta mesma linha de simplicidade. Joga com reflexos dos espelhos e janelas do carro, assim como acentua as luzes externas ao veículo, como faróis de outros veículos e iluminação da pista, contrastando com a relativa escuridão no interior do carro de Ivan. A sensação de andar de carro sozinho em meio a madrugada, refletindo sobre as escolhas da vida enquanto luzes difusas passam pela janela, impera em todas as cenas. Isso ajuda a criar um ambiente em volta do carro, que nos insere dentro deste como um pequeno e íntimo universo de Ivan, que cada vez mais parece reduzido ao veículo que dirige.



A atuação desse filme é, talvez, o ponto forte dele. Tom Hardy é o único ator que aparece fisicamente no filme, o que faz dele um ponto preciso da trama. Suas feições e reações enquanto ouve, fala e dirige são essenciais ao telespectador, e devo dizer que isso foi feito com sucesso, pois caso contrário não teríamos metade da empatia gerada, ainda mais quando o tempo de tela do ator equivale a 99% do filme. Os atores que dão voz aos conhecidos de Ivan, do outro lado da linha, também fizeram um trabalho fantástico. Algumas vezes passa despercebido que atuar também significa falar, ou dublar, e quando mal feito pode gerar o oposto do que se pretendia. As emoções daqueles que conversam e recebem notícias de Ivan são tão importantes quanto o próprio protagonista, ou até mesmo o carro. As excelentes atuações dos outros atores deixam claro uma oposição entre o mundo dentro do carro e o mundo exterior ao carro, este último que parece cada vez mais distante.



Com simplicidade e precisão na proposta, Locke é um bom filme. Uma história relativamente curta que aposta na pura experiência humana em fazer escolhas e arcar com as consequências destas da melhor, ou pior, maneira possível, mesmo que isso destrua a vida daqueles ao redor. Um bom exemplo de que é possível fazer um trabalho bem feito sem grandes orçamentos e projetos mirabolantes.

Título Original: Locke

Direção: Steven Knight

Elenco: Tom Hardy, Olivia Colman, Ruth Wilson, Andrew Scott e Ben Daniels


Sinopse: Ivan Locke, um engenheiro civil de sucesso e um dedicado pai de família, recebe um telefonema na véspera de um dos momentos mais importantes de sua carreira, que dá início a desestruturação de tudo aquilo que construíra e cultivara como mais valioso em sua vida.

TRAILER:
Gostou do filme? Mais ainda da crítica? Deixe aqui nos comentários o que achou e não deixe de acompanhar a programação do MVDC.

1 thoughts on “Crítica: Locke (2013, de Steven Knight)”

  1. O que foi relatado durante o filme é que se passaria por aproximadamente 90 minutos e no meio da trama é informado o horário de 21:00. Ou seja, o filme ocorre entre 20:00 e 22:00 entre Londres e e uma cidade com uma distância média entre 150-200 km(Birmingham).

Deixe uma resposta