Crítica: Match Point (2005, de Woody Allen)

Quando assistimos um filme de Woody Allen somos invadidos por sentimentos diversos. Algumas obras do diretor causam rebuliço e raiva pela “suavidade” que certas coisas são tratadas; personagens femininas são representadas como sedutoras de homens inocentes ou pelo ambiente “além filmes”, a famigerada vida real, em que o diretor não é lá umas das melhores pessoas do planeta. Match Point, no entanto, é uma grata surpresa.

Match Point é um jogo de tênis. Mostra um jogo que todos jogamos, mas que só alguns possuem crueldade suficiente para vencer e prosseguir no campeonato. A habilidade necessária para chegar ao fim e levantar o prêmio vai muito além do que acertar a bola no momento certo e na velocidade precisa, vai da capacidade de, principalmente, colocar a torcida ao seu favor, fazê-la vibrar, torcer, rir e chorar conforme desenha cada movimento e a bola quica na quadra. Aqueles que não possuem tal habilidade ficam para trás na competição, condenados a ficar na mesma vida financeira em que nasceram.
O estômago necessário para fazer algumas jogadas é, acima de tudo, essencial para a continuação no jogo, assim como Chris (Jonathan Rhys Meyers), o protagonista, fez durante a narrativa para manter estável seu relacionamento com Chloe (Emily Mortimer); este fora capaz de adentrar em um mundo corporativo ao qual não era o que desejava para sua vida. O protagonista sabe jogar esse jogo, tem o necessário para manipular e descartar tudo e todos que forem essenciais para conquistar o público. Até mesmo seus sonhos e gostos.
Mas até aí as coisas parecem muito simples, jogar o jogo da ascensão social é, para alguns, apenas uma questão de habilidade e/ou sorte. E é aí que entra a problemática do filme. Na estratégia de conseguir o que deseja, o protagonista conhece Nola (Scarlett Johansson), que balança seus planos. A forma como eles se conhecem não é meramente despretensiosa. Ambos jogam o mesmo jogo, ambos são externos à família com a qual estão se relacionando e ambos querem o prêmio dado ao vencedor. Jogando ping pong,  descobrem determinadas habilidades um do outro, criando uma instantânea conexão e tensão sexual. O ambiente dessa atração irresistível os coloca em um dilema: dois jogadores podem jogar o mesmo jogo, mas não para sempre do mesmo lado.
A evolução do relacionamento dos personagens é intensa e conflituosa, nos levando ao “match point”, jogada decisiva que encerra uma partida de tênis. A falta de sorte de Chris, que o retirou de sua carreira anterior, jogador profissional de tênis, é colocada em prova nas decisões finais em que toma para finalizar seus planos, numa avalanche de sacadas em que o universo decidirá se serão sucesso ou fracasso.

As construções de cena são fantásticas, talvez o ponto mais forte de Woody Allen depois da naturalidade dos diálogos escritos. Recheado de obras de arte, o filme é montado dialogando com pinturas, esculturas, livros e óperas. Vale ressaltar a conexão clara com Crime e Castigo, de Dostoiévski. Existe essa intelectualidade em todas as obras do diretor, mas nesse caso não só é uma referência; há uma cena em que Chris lê uma obra sobre o autor russo. Woody Allen gosta de mostrar ao seu público que faz sua lição de casa ao referenciar tantas obras e misturá-las de forma excepcional ao que está construindo, como na fantástica cena no prédio de Nola, em que o clímax de uma ópera é colocada como trilha sonora do clímax do filme.

Como ponto fraco, destaca-se a construção de personagens femininas. De forma quase que a justificar as ações de Chris, Chloe é mostrada como uma mulher desinteressante, até tediosa, em que o protagonista rasteja para manter a relação, enquanto Nola é misteriosa e sedutora, mais do que uma garota rica, uma estrategista. Esse tipo de reprodução coloca uma dinâmica bem problemática em todos os relacionamentos do filme: homens estáticos e firmes encabeçando o relacionamento; mulheres variáveis e temperamentais, necessitando de alguém para “guiá-las”. Prova disto está em quais personagens está o poder de começar, ou terminar, o relacionamento, como também a censura comportamental daquilo que é certo e errado. Chole e Nola poderiam ser muito mais do que foram retratadas, tão complexas e, talvez, pouco aproveitadas.


Um filme estético, cruel e repleto de minúcias. Apesar dos pesares que rodeiam o diretor, uma obra que vale o tempo investido em vê-la.

Título Original: Match Point
Direção: Woody Allen
Elenco: Scarlett Johansson, Jonathan Rhys Meyers, Paul Kaye, Matthew Goode, Brian Cox, Penelope Wilton, Emily Mortimer
Sinopse: Chris Wilton, após abandonar sua carreira como jogador profissional de tênis, começa a trabalhar como professor particular em um clube esportivo da alta sociedade britânica. Cria de imediato uma relação de amizade com seu aluno, Tom Hewett, e um envolvimento com a irmã dele, Chloe Hewett. O destino dessa relação parece claro e favorável à Chris até conhecer Nora Rice, noiva de Tom, com quem cria uma instantânea tensão sexual.

Trailer:


Gostou do filme? Mais ainda da crítica? Deixe aqui nos comentários o que achou e não deixe de acompanhar a programação do MVDC.

Deixe uma resposta