Crítica: A Qualquer Custo (2016, de David Mackenzie)


2016, de fato, não está sendo um ótimo ano para o cinema. Eu, pessoalmente, tive grandes decepções. Sem dúvidas, o ano vem melhorando – porém. Excelentes filmes como Elle (http://minhavisaodocinema.blogspot.com.br/2016/11/critica-elle-2016-de-paul-verhoeven_15.html), A Chegada (http://minhavisaodocinema.blogspot.com.br/2016/11/critica-chegada-2016-de-denis-villeneuve.html) e Capitão Fantástico (http://minhavisaodocinema.blogspot.com.br/2016/11/critica-capitao-fantastico-2016-de-matt.html) são a prova disso. A Qualquer Custo também pode contribuir para a elevação do ano em termos cinematográficos. Para mim – com certeza – contribuiu.


O filme em questão é dirigido por David Mackenzie, e ele faz um trabalho sólido e imaginativo – apesar da total falta de originalidade da premissa. Ele usa planos longos, que poderiam ser cortados antes, mas o diretor demonstra ser muito paciente e astuto e saber exatamente do que a trama precisa. Ele faz um ótimo trabalho ao estabelecer o tom da narrativa logo em seus primeiros minutos – que, aliás, são muito bons. Mackenzie não faz questão de diferenciar o filme dos outros do gênero, mas consegue imprimir originalidade em sua direção. Além disso, o diretor também poupa o público de diálogos expositivos e, em um exemplo, nos mostra tudo o que precisamos saber em um enquadramento, que mostra a distância entre dois personagens e a sombria relação construída no passado entre eles e faz da iluminação um instrumento para mostrar a esperança de um deles de restaurar a relação, enquanto o outro não tem a mínima vontade e nem esperança.

O roteiro do filme é engraçado, sem furos e trata de temas importantes como o racismo do americano comum (não todos, é claro) coisa que fica muito forçada em alguns momentos por parte do personagem de Bridges. O porte de armas (muito brevemente, mas em tempos onde o assunto está sendo tão discutido nos Estados Unidos, é interessante ver algo sobre isso) também é discutido. Escrito por Taylor Sheridan, o roteiro também lembra filmes de Quentin Tarantino no sentido de ter pequenos momentos absolutamente memoráveis (há uma cena aonde o personagem de Chris Pine dá uma surra em um personagem aleatório que é um dos momentos mais satisfatórios que eu já vi). Se fosse para definir o filme, eu o definiria como uma mistura de Onde Os Fracos Não Têm Vez e Tarantino.

Tecnicamente, é um filme perfeito. A montagem é irretocável, todas as cenas empurram a narrativa, nenhuma fica de graça. E, também por causa da montagem, as cenas dos personagens de Chris Pine e Ben Foster e do personagem de Jeff Bridges ficam muito bem interligadas. Quando um dos segmentos começa a ficar enfadonho, o filme já muda para o outro. O montador Jake Roberts fez um excepcional trabalho aqui. A trilha sonora original, composta por Nick Cave e Warren Ellis, é muito boa e chegou a me lembrar os primeiros trabalhos do gênio Ennio Morricone. E mais, a coletânea de músicas do filme é excelente e se encaixa perfeitamente na trama. Mesmo eu não sendo um grande fã de Country Music, admirei muito a escolha das músicas. A edição de som também é extremamente admirável, é um filme muito bom de se ouvir, seja por sua trilha sonora, coletânea ou trabalho técnico dos editores e mixadores de som.

A fotografia é uma das mais bonitas do ano e a direção de arte também. Ambas trabalham juntas para nos transportar para a cidadezinha pequena no oeste do estado do Texas. A edição é extremamente coesa e imprime um ritmo rápido, e o jogo de câmeras é muito bom – destaque para uma cena aonde o diretor nos dá uma visão 360 graus de um lugar sem mexer a câmera, apenas por meio de cortes.

Chris Pine tem uma atuação contida, mas isso é necessário para o personagem que ele interpreta. Um homem receoso e amargurado. Porém, o show aqui fica por conta de Jeff Bridges e Ben Foster. Bridges notavelmente está muito confortável no personagem. Ele o constrói como um homem “engraçadão” até demais, que irrita tanto à seu colega quanto ao público que o assiste e, ao mesmo tempo, um delegado extremamente imponente. É um personagem bem intencionado, mas sua ansiedade pela aposentadoria o coloca na zona de conforto em alguns momentos, e o público sente a necessidade de o julgar por isso, apesar de entendê-lo. Ben Foster está inacreditavelmente bem aqui. O ator é extremamente carismático, engraçado e, quando preciso, ameaçador. É incrível como o ator consegue fazer o público gostar tanto de um assaltante de bancos que passou 10 anos na cadeia – e não é um daqueles casos aonde o personagem foi condenado injustamente, ele mereceu os anos que passou atrás da grades. Acredito que Bridges e Foster tem grandes chances de serem indicados ao Oscar de Melhor Ator Coadjuvante, e torço para que isso aconteça (se fosse para escolher entre os dois, acho que escolheria Ben Foster. Eu realmente adorei o seu trabalho nesse filme).

A relação entre Pine e Foster é absolutamente perfeita. Não é original, lembra vários “buddy-movies” (nesse caso, um ”brother-movie”), mas, dentro da narrativa desse filme, ela funciona perfeitamente. No começo, o personagem de Chris Pine parece ser receoso quanto ao que eles estão fazendo, mas, ao longo da projeção, o personagem parece ficar mais confortável com isso, e – consequentemente – a relação com seu irmão se torna mais agradável, tanto para eles, quanto para quem os assiste.

O filme usa muitos planos perfil e drones, o que dão uma escala e valor de produção mais elevado ao filme. O diretor de fotografia Giles Nuttgens faz um contraste genial em uma cena perto do final. As cenas aonde os personagens de Pine e Foster estão agitados e ferozes são muito ensolaradas e vibrantes, e uma cena aonde Chris Pine está extremamente abalado apresenta uma fotografia nublada e depressiva.

A fluídez e a energia brutal imprimida por Mackenzie e Jake Roberts são muito aparentes, deixando o ritmo extremamente ágil, o que faz o filme ficar muito divertido. O diálogo final do filme é genial. Há um peso emocional e uma tensão muito grandes. Apresenta uma relação extremamente racional entre dois personagens que não estariam errados se quisessem matar um ao outro (o ato seria com certeza errado, não me entendam mal). Falando em tensão, há uma cena no terceiro ato que mostra um personagem na mira do rifle de outro, e o diretor deixa a câmera no personagem que está na mira, não no que está mirando, o que te faz roer as unhas esperando o tiro chegar e explodir a cabeça de um deles. O final é muito bom, e minimalista, grandes tiroteios não acontecem – embora o filme sugira um, aonde o público fica muito dividido sobre para quem torcer, e, de certa forma, aliviado por aquilo não ter que acontecer.



Hell Or High Water é um faroeste moderno não original, mas que não se propõe a ser. Sua direção, roteiro e – principalmente – atuações o elevam, e o colocam no patamar de um dos melhores filmes do ano, e – merecidamente – deve ser lembrado no Oscar. Definitivamente merece ser assistido pelas pessoas que curtem o mais puro cinema. Se você gostou de Onde Os Fracos Não Têm Vez, com certeza vai gostar também desse filme.

Título Original: Hell Or High Water

Direção: David Mackenzie

Elenco: Chris Pine, Ben Foster, Jeff Bridges, Gil Birmingham, Dale Dickey, Buck Taylor, Marin Ireland, Katy Mixon, Kevin Rankin, Melanie Papalia, Dylan Kenin, Gregory Norman Cruz

Sinopse: Dois irmãos, um ex-presidiário e um pai divorciado com dois filhos, perderam a fazendo da família em West Texas e decidem assaltar um banco como uma chance de se restabelecerem financeiramente. Só que no caminho, a dupla se cruza com um delegado, que tudo fará para capturá-los.



TRAILER:



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