Crítica: 007 Contra Spectre (2015, de Sam Mendes) – A despedida de Daniel Craig como James Bond?

Depois de Kingsman – Serviço Secreto e A Espiã Que Sabia de Menos satirizarem e homenagearem o subgênero da espionagem; depois de O Agente da U.N.C.L.E. fazer uma estilosa referência retrô aos espiões dos anos 60; depois de Missão Impossível 5 – Nação Secreta eletrizar o mundo e tornar Tom Cruise em um 007 americano, chega a vez de conferir o novo capítulo da saga mãe. 007 Contra Spectre é o 24° filme oficial da saga, não levando em conta 3 filmes não oficiais. Para vê-lo, alguns meses antes eu fiz uma maratona com simplesmente todos os 23 filmes oficiais anteriores e de bônus os 3 não oficias também. Agora finalmente fui ao cinema conferir o novo filme.

Spectre é a produção mais cara da saga, precisa arrecadar muito para se pagar. Mas pela boa bilheteria que está rendendo até então, conseguirá isso tranquilamente. O filme vem dividindo a opinião da maior parte da crítica e dos fãs. No geral o saldo está positivo, embora a maioria reclame de algumas coisas. Mas o longa consta com uma aprovação de até 70% dos críticos, o que não é nada mal. O que eu achei? Embora não seja tão perfeito quanto o Cassino Royale e o Operação Skyfall, primeiro e terceiro da era Craig respectivamente, o filme é bem melhor que Quantum of Solace, o segundo 007 de Daniel Craig que é bastante criticado (mas que não acho tão ruim assim). Na verdade Spectre chega bem próximo de ser tão bom quanto Cassino Royale ou Skyfall.


Entre os claros defeitos, há os típicos clichês e cenas impossíveis de filmes de ação, como soluções fáceis demais, o herói imbatível e bom de mira, além do velho estilo um pouco machista de Bond, com cenas que às vezes lembra um comercial de whisky ou outro produto masculino. Há algumas coisas um pouco forçadas, como Bond acertar um helicóptero à bala de longe ou arrancar a porta com as mãos, mesmo que já destruída. O roteiro, por apostar no básico demais, não é ousado ou original, sustentando-se em elementos já vistos em cena. Isto acaba fazendo com que o ótimo elenco e ótimos personagens sejam um pouco desperdiçados. Sim estes defeitos impedem que o filme seja perfeito é verdade, mas há uma série de acertos que tornam o filme muito bom mesmo assim.

Daniel Craig, apesar de aparentar bem velho, finalmente está bem à vontade no papel, atuando um pouco melhor, de maneira mais madura. Inclusive aqui ele está mais bem humorado, cheio de piadas irônicas. O excelente ator Christoph Waltz, que já venceu o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante duas vezes recentemente, pelos filmes Bastardos Inglórios e Django Livre, ambos de Quentin Tarantino, só não atua de maneira perfeita pois direção e roteiro não puxaram isso. Mesmo assim seu personagem é interessantíssimo, sendo um bom vilão, que tem uma certa ligação emocional com Bond e sendo o mentor por assim dizer de todas desgraças ocorridas nos filmes anteriores.

Entre as Bond Girls, elemento básico de qualquer filme de 007, temos a bela protagonista Léa Seydoux (a atual queridinha da França), que dá conta do recado. A belíssima italiana Monica Bellucci (minha atriz favorita) aparece pouco, mas deixa sua marca como a primeira Bond Girl com mais de 50 anos. E ainda temos a mexicana Stephanie Sigman, que participa da sequência de abertura do filme. O restante do ótimo elenco está bem, cada um desempenhando seu papel com eficiência e classe tipicamente britânica.

A trilha sonora do filme é eficiente na maior parte do tempo. Os efeitos especiais são muito bons. Aliados à alguns momentos eficientes da direção de Sam Mendes, como alguns planos de sequência abertos inspirados, privilegiando as locações, paisagens e fotografia, visualmente não há do que reclamar do filme. A ação empolga em alguns momentos, como na cena do helicóptero no início, a perseguição de carro em Roma e em alguns momentos no final do filme, embora este pudesse ser melhor e mais eletrizante. Mesmo que longo (mais de duas horas e meia) e com momentos bem dramáticos, o filme consegue fluir bem, sendo bem intenso em alguns momentos.

Se o roteiro não aposta em nada novo, ao menos acerta em apostar nas referências. Quase todas cenas e detalhes foram pensados como referências e homenagens à toda a saga. Só quem viu todos filmes pode observar. Além de recapturar e se interligar com os três filmes anteriores da era Craig, afinal a organização Spectre estava manipulando tudo, existem menções aos filmes clássicos também. A ação mais insana lembra os filmes setentistas do Roger Moore. O forte vilão do ator e lutador Dave Bautista (de Guardiões da Galáxia) tem unhas de metal, numa referência aos dentes de metal do personagem Jaws dos 007 O Espião Que Me amava (1977) e O Foguete da Morte (1979), interpretado por Richard Kiels, que faleceu em 2014. As fantasias de caveira do início do filme levemente lembram os vilões praticantes de voodoo de 007 – Viva e Deixe Morrer. E assim por diante, o filme é só homenagens à franquia. Além de ser claramente um belo adeus a Daniel Craig, com um final digno para o ator, que muitos gostem ou não, deixou sua marca.

Não devo deixar de comentar sobre toda a sequência de abertura, no Dia dos Mortos (feriado mexicano), que é uma das mais extraordinárias de toda saga. É a melhor cena do filme, funciona quase que como um curta, um filme próprio dentro do filme. A direção é caprichada, cheia de sequências eletrizantes, algumas cenas longas, inteiras e sem cortes. O feriado é muito bem retratado, com cenas visualmente incríveis, além de um figurino e direção de arte impecáveis. A ação é desenfreada, na já citada cena do helicóptero, que é sensacional. E por fim sobe a psicodélica abertura musical que todo 007 tem, desta vez na voz de Sam Smith na canção Writing’s On The Wall. A abertura claramente mostra Craig, mais uma vez homenageando ele.

Se Daniel Craig volta nos próximos filmes, somente resta esperar. Somente talvez, se este filme arrecadar muito dinheiro. Porém já poderia para por aqui em paz. Seu último filme não é o melhor, mas é ótimo para os fãs da saga. Sam Mendes, que havia dirigido o excepcional Skyfall, já pode voltar a fazer seus dramas de impacto, como seu melhor filme Beleza Americana. 007 é uma das únicas sagas do cinema (talvez a única) em que temos a impressão de que nunca pararão de chegar novas aventuras. É clássica, é charmosa e é um marco na cultura pop. Aguardemos assim para saber o rumo da franquia. Quem será o novo James Bond e que estilo terão os novos filmes? Aguardemos ansiosos. Até lá, corra ao cinema mais próximo e assista 007 Contra Spectre.


Direção:
Sam Mendes

Elenco:
Daniel Craig, Christoph Waltz, Léa Seydoux, Ralph Fiennes, Monica Bellucci, Ben Whishaw, Naomie Harris, Dave Bautista, Andrew Scott, Rory Kinnear, Jesper Christensen, Alessandro Cremona, Stephanie Sigman.

Sinopse:
James Bond (Daniel Craig) vai à Cidade do México com a tarefa de eliminar Marco Sciarra (Alessandro Cremona), sem que seu chefe, M (Ralph Fiennes), tenha conhecimento. Isto faz com que Bond seja suspenso temporariamente de suas atividades e que Q (Ben Whishaw) instale em seu sangue um localizador, que permite que o governo britânico saiba sempre em que parte do planeta ele está. Apesar disto, Bond conta com a ajuda de seus colegas na organização para que possa prosseguir em sua investigação pessoal sobre a misteriosa organização chamada Spectre.


Trailer:


Canção ‘Writing’s On The Wall’ de Sam Smith:


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