Crítica: Cinderela (2015, de Kenneth Branagh) – Quando um velho clichê é muito bem-vindo!

A Disney sempre conseguiu um feito invejável: a cada década marcar sua geração com os clássicos contos de fadas e princesas. E isso vem sendo feito desde 1937, quando o estúdio lançou seu primeiro grande sucesso intitulado Branca de Neve e Os Sete Anões. De lá para cá foi uma enorme quantidade de desenhos e animações que encantaram não apenas a criançada, mas o público em geral. Porém com a chegada dos ano 2000, parece que a magia se perdeu um pouco. Afim de resgatar o velho estilo, na virada de 2007 para 2008, a Disney lança o musical Encantada, filme que começa como desenho animado, porém a princesa vem parar em nosso mundo real (sim, a princesa se torna uma atriz real, Amy Adams). O filme trouxe o conto de fadas clichê, porém com uma nova abordagem sobre o amor verdadeiro, sendo ele muitas vezes alguém que não é o príncipe. Com o sucesso do filme, resolveu-se então retornar aos velhos contos de fadas. Em 2009 a animação A Princesa e o Sapo trouxe desta vez a primeira princesa negra e em uma tradicional animação 2D.

Em Alice no País das Maravilhas (2010) e na mãos de Tim Burton, temos um filme live-action (atores reais) bastante feminista e cheio de batalhas épicas. Em’Enrolados (animação agora em 3D) no final de 2010, a Disney traz uma releitura de Rapunzel, com uma versão alternativa, um tanto feminista e de novo mostrando que o amor muitas vezes não vem do príncipe encantado. Com Oz – Mágico e Poderoso (2013 e em live-action) temos um prelúdio mais humano do clássico conto do Mágico de Oz. No mesmo ano, a animação Frozen – Uma Aventura Congelante vira um fenômeno, trazendo um outro tipo de amor verdadeiro: o de irmãs, a força da família; além de uma forte pegada feminista novamente. Em 2014 e com Angelina Jolie, Malévola traz uma versão live-action épica, mostrando o porquê da bruxa do conto A Bela Adormecida ser como é. Este é outro filme bastante feminista, mostrando o amor verdadeiro na forma de afeição materna, mesmo que a bruxa não seja a mãe legítima da criança. Também em 2014 vários contos dos irmãos Grimm foram adaptados de maneira amarga no musical live-action Caminhos da Floresta.

Mas não foi apenas a Disney que fez suas releituras. Outros estúdios fizeram novas versões live-action de Branca de Neve e o Caçador, Jack – O Caçador de Gigantes (baseado em João e o Pé de Feijão), A Fera (logicamente sobre A Bela e a Fera), A Garota da Capa Vermelha, João e Maria – Caçadores de Bruxas, uma versão francesa de A Bela e a Fera (2014) e até mesmo uma versão deprimente e pesada de A Bela Adormecida intitulada Beleza Adormecida. Mas chegamos por fim em 2015 e é hora de falar do atual novo sucesso da Disney: Cinderela.


Este longa live-action vai contra a tendência atual de inovar com elementos góticos, batalhas grandiosas e exagerados efeitos especiais. Longe disso, Cinderela traz uma versão mais simples e clichê possível. Mas ao contrário do que se imagina, esta simplicidade é o grande trunfo do filme, nos entregando um conto de fadas muito sincero e genuíno. O roteiro simples nos traz praticamente um remake da animação original, com cenas bem parecidas. E mesmo que nunca brilhante, o roteiro e os diálogos são sinceros, controlados e tem seus momentos humanos, como aquele diálogo final da madrasta, justificando um pouco o motivo dela ser amargurada. Ali há um pouco de liberdade criativa, além de tornar a cena e as personagens mais reais. Há ainda alguns momentos de morte muito bem tratados, bem filmados e sinceros, podendo assim emocionar mas sem forçar demais. Uma coisa que anda em falta nos romances atuais mas que aqui dá certo é a química do casal, uma vez que Cinderela e o príncipe mostram simpatia e entrosamento em cena.

Lily James está muito bem como a protagonista, uma verdadeira surpresa, passando carisma, humildade e gentileza a cada cena. Cate Blanchett como a madrasta é o ponto forte do elenco. Incrível como a experiente atriz sempre dá um peso a mais nos filmes em que participa. Sua personagem é forte e crível. O restante do elenco está ok, embora nada de especial. Até a genial Helena Bonham Carter está bem como a fada madrinha. A direção de Kenneth Branagh é cuidadosa em cada aspecto, principalmente em quesito visual. Ao contrário de outros filmes onde tudo é feito em computação, aqui cada maquiagem, penteado, cada vestido e outros figurinos, as escadarias, quadros, candelabros, direção de arte; tudo real, enriquecendo muito o filme. Isto dá um senso de realidade, além de encher os olhos. Kenneth Branagh sempre adaptou muito bem filmes épicos, como algumas obras Shakespearianas. E aqui sua direção cuidadosa dá peso e valor ao filme.


Os poucos efeitos visuais do filme estão nas cenas de magia e transformações. E nessas cenas os efeitos estão ótimos, porém sempre controlados, nunca exagerados e chamando demasiadamente a atenção para si, mas sendo apenas mais um adereço ao longa. As piadas na sua maioria das vezes funcionam, devendo agradar a criançada, principalmente nas cenas dos fofos ratinhos. Nestes momentos mais leves e fofos o filme lembra muito todos nossos filmes de infância, com fantasia e bichinhos falantes. Um filme realmente leve e belo para toda família.

Minha namorada e eu saímos satisfeitos da sala de cinema, com um sentimento bom. Por mais bons que sejam grandes filmes de ação e de super heróis, ou filmes reflexivos e que retratem da realidade, ver um belo conto de fadas de vez em quando é ótimo para viajarmos um pouco e sonharmos acordados. E este novo Cinderela proporciona isso. Para um filme que eu não esperava muito, é uma das grandes surpresas de 2015 até então. Visualmente rico, com uma trilha sonora envolvente, uma grande direção de Kenneth Branagh, o que mais marca é a simplicidade. Um filme que não tenta ser grande demais. Apenas traz um conto já conhecido de maneira suave e respeitosa. Com momentos sinceramente emocionantes. Em tempos em que muitos querem chamar a atenção por ousar ou chocar, a equipe deste filme merece palmas por tornarem o longa justamente aquilo em que ele diz várias vezes na sua frase base. Em vários momentos é dito algo que todos nós devemos tentar:

“Tenha coragem e seja gentil. Onde existe gentileza, existe bondade. E onde existe bondade, existe magia”

Bônus: quem for ver Cinderela nos cinemas poderá ver antes do filme a exibição do curta animado Frozen – Febre Congelante. Trata-se de um divertido complemento do filme Frozen – Uma Aventura Congelante e que serve para matar a saudade das personagens e nos preparar, pois Frozen 2 em breve começará a ser feito pela Disney.

Direção: Kenneth Branagh

Elenco: Hayley Atwell, Lily James, Helena Bonham Carter, Richard Madden, Cate Blanchett, Holliday Grainger, Sophie McShera, Stellan Skarsgård, Nonso Anozie, Ben Chaplin, Rob Brydon, Eloise Webb.

Sinopse: a história segue a vida da jovem Ella (Lily James), cujo pai comerciante casa novamente depois que fica viúvo de sua mãe. Ansiosa para apoiar o adorado pai, Ella recebe bem a madrasta (Cate Blanchett) e suas filhas, Anastasia (Holliday Grainger) e Drisella (Sophie McShera), na casa da família. Mas quando o pai de Ella falece inesperadamente, ela se vê à mercê de uma nova família cruel e invejosa. Relegada à posição de empregada da família, a jovem sempre coberta de cinzas, que passou a ser chamada de Cinderela, bem que poderia ter começado a perder a esperança. Mas, apesar da crueldade a que fora submetida, Ella está determinada a honrar as palavras de sua falecida mãe: tenha coragem e seja feliz.

Trailer:



Canção ‘My Blood’ de Ellie Goulding:

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